segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

A Folha e a Ditabranda

Como eu já desisti dos jornais há algum tempo, nem me toquei da história do editorial da Folha em que a ditadura militar brasileira foi chamada carinhosamente de "ditabranda" - pra falar a verdade, vi algumas coisas meio en passant pela blogosfera, mas passei batido, só me dei conta do que realmente aconteceu hoje e só agora tive tempo para escrever algo a respeito. De fato, é um assunto da mais alta gravidade e casa com o post anterior.

Tudo começou em um editorial da Folha contra a vitória chavista no recente referendo onde o termo "ditabranda" foi usado ironicamente para definir a nossa ditadura militar em uma pretensa contraposição ao governo Chávez. Em primeiro lugar, como eu coloquei num post por aqui mesmo, o governo Chávez tem seus defeitos assim como tem suas virtudes, mas se ele está sendo tão duradouro, isso se deve a argumentos como esses - por parte da mídia venezuelana e da oposição local -, que de maneira totalmente deseducada, violenta e burra consegue voltar a carga justamente para os avanços do país no período.

Por mais defeitos que tenha Chávez, no entanto, comparar seu governo ao regime militar que tivemos ou os que aconteceram pelo continente é duvidar da inteligência alheia. Dizer que tivemos uma "ditabranda" enquanto lá existe uma terrível ditadura é um hediondo atentado contra a natureza - levando em conta que estamos tratando de uma publicação impressa.

Na Venezuela há liberdade partidária, liberdade de expressão, ninguém é torturado, jornalistas não são suicidados e, pasmem, empresas televisivas que servem de promoters de golpe de Estado continuam no ar rigorosamente até o encerramento de seus contratos de concessão pública. Claro, isso gerou duras e justas reações dos leitores - inclusive de nomes celébres como o Professor Fábio Konder Comparato e a Professora Benevides, agora deem uma olhada na Nota da Redação:


A Folha respeita a opinião de leitores que discordam da qualificação aplicada em editorial ao regime militar brasileiro e publica algumas dessas manifestações acima. Quanto aos professores Comparato e Benevides, figuras públicas que até hoje não expressaram repúdio a ditaduras de esquerda, como aquela ainda vigente em Cuba, sua"indignação" é obviamente cínica e mentirosa

Não sei se algum desses meus dois ou três leitores já ouviu falar em Lei de Godwin (não vou explicar ela, leia o que tá no link), mas no Brasil com toda certeza do mundo foi inventada uma variação dela, onde todas as vezes que um direitista perde a razão num debate com um esquerdista, ele cita Cuba totalmente fora de contexto para desviar o foco de suas contradições. Foi o que aconteceu aqui. A Folha relativizou a ditadura e não se retratou. Simples assim.

Qualquer conhecedor mediano da história brasileira sabe o quanto a Folha colaborou com a ditadura, sabe o quanto ele se modificou por puro oportunismo nos anos 80 e sabe o quanto ele despirocou com a saída de cena de Otávio Frias e a consequente ascensão de Otavinho. Isto aqui, no entanto, é um divisor de águas. Não porque signifique uma mudança de rumo da Folha - não é -, mas sim porque significa uma alteração substancial na tática dela; antes o que era velado, de agora em diante vai ser aberto. Se nada for feito, isso tornará o Brasil incrivelmente parecido com a Venezuela, não pela política, mas pela mídia.

12 comentários:

  1. A classificação de ditabranda pela Folha não é nada surpreendente, já que partida de um jornal que alimentou simpatias pela tentativa de golpe do general Sylvio Frota.

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  2. Sem dúvida, Anrafel, não é mesmo - isso surpreendeu mesmo apenas aqueles que ainda colocavam alguma fé no dito jornal.

    O fato é que isso preocupa porque, bem ou mal, estamos falando de um meio de comunicação com algum peso fazendo uma pregação desse tipo - essa alteração de tática é preocupante e não pode passar batido, admitir esse tipo de coisa é admitir coisas mais graves daqui há pouco tempo, daí a necessidade do protesto.

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  3. Hugo, eu escreverei nesse comentário o mesmo que tenho dito nas minhas intervenções "desrespeitosas" feitas em sala de aula, na PUC-SP:
    " Só vejo duas espécies de indivíduos defendendo a ditadura militar brasileira: o reacionário, que de alguma forma tirou para si ou para sua familia proveitos e "proventos" possibilitados pelo regime ou o idiota, o imbecil, com uma cultura política inferior à de uma barata, mais conhecidos como "alienados". O Otavinho se encontra dentre a primeira espécie (reacionários), e os leitores assíduos da Folha dentre a segunda (alienados).

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  4. É o mesmo que o neoliberalismo: Um caldo de meia dúzia de "espertos" junto com uma multidão de idiotas úteis a seu serviço - é só dar uma camiseta que a tchurma já entra no time como nós bem sabemos ;-)

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  5. O companheiro sabe com que trocas saudações?

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  6. Talvez eu desconfie, mas saber, eu não sei, com quem seria?

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  7. assim nao pode - tem q tentar adivinhar - tens uma chance companheiro!

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  8. Tovarich, perdi. Tenho uma lista de suspeitos, mas você pode ser qualquer um e ao mesmo tempo ninguém - no fim das contas, como diria Lacan, "eu sou um outro" e isso vale para todos. Então, por ora você é o nome do teu blog mesmo ou a identidade que você quiser, afinal de contas, estamos na Internet e por aqui a identidade é um ato de vontade, não uma norma.

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