As notícias que chegam agora pelas agências internacionais - e TV's de todo mundo - é de que a (longeva) tirania de Kadafi está prestes a cair na Líbia. Não há como não comemorar a queda de um despotismo como aquele, mas aqui, as coisas não são tão simples quanto no Egito ou na Tunísia.
O primeiro ponto é como a revolta tunisiana se espalhou por todo mundo árabe, sobretudo o gigantesco Egito, derrubando a ditadura Mubarak. Revoltas multitudinárias, espontâneas e surpreendentes, que botaram abaixo uma série de regimes autoritários, cuja existência e persistência no poder era inacreditavelmente duradoura.
Nem na Tunísia, nem no Egito, as potências ocidentais mostraram-se muito animadas com os ventos revolucionários - o que certamente não era à toa, uma vez que eram seus aliados a cair.
Em um primeiro instante, houve uma tentativa de deslegitimar os movimentos. Depois, houve aceitava com ressalvas. Mas não resta dúvida que aqueles movimentos representavam uma derrota para americanos e europeus.
Já no caso líbio, estranhamente, o Ocidente não apenas se mostrou favorável ao movimento anti-despotismo local como lhe deu armas e o ajudou militarmente - de forma direta, inclusive. Não só, o movimento que se opôs a Kadafi, longe de lotar praças, tinha um caráter claramente militar e elitizado.
Com o cerco da Otan e o numeroso - e bem armado, embora amador - exército rebelde, era questão de tempo para o excêntrico Kadafi cair mesmo. A questão não é, portanto, uma avaliação moral do regime que cai, que não deixa muitas dúvidas quanto ao seu caráter, mas sobre o que se esconde por detrás de sua queda.
E as evidências que temos não são muito animadoras. Os rebeldes locais, com suas conexões duvidosas e a Otan nas fronteiras - possivelmente em seu território - não significam nada muito alentador para as massas revoltosas do mundo árabe.
As multidões rejeitam ao mesmo tempo o imperialismo e a tirania (seja de que tipo for), entretanto, tais tiranias, pró ou anti-americanas, são tributárias das condições políticas produzidas pelo primeiro fenômeno. Essa relação nem sempre está clara e é nesse flanco que Estados Unidos e Europa operam nesse movimento.
Portanto, levando em consideração os desdobramentos possíveis, a ingovernabilidade da nova Líbia ou mesmo a construção de um cavalo de tróia, temos o primeiro lance efetivo das potências na reação à onda revolucionária. Torçamos para que a Líbia pós-Kadafi escape à sanha da Otan, mas isso é um problema objetivo e imediato agora.
"Torçamos para que a Líbia pós-Kadafi escape à sanha da Otan"
ResponderExcluirInfelizmente, não acredito que assim o será:
"Bem, estamos na Líbia por causa do petróleo."
Luis,
ResponderExcluirNão só petróleo, mas a própria posição estratégica para controlar uma série de territórios petrolíferos no Magreb - e, talvez mais importante do que isso, o controle do acesso do contingente humano magrebino que tem servido para formar o exército de reserva europeu desde o pós-guerra. Isso sem falar na própria intervenção no processo revolucionário por todos os países árabes.
abraços
Qdo a ditadura foi implantada aqui em 64, o novo chanceler brasileiro disse: "o que é bom para os EUA é bom para o Brasil". Viramos a declaração do eminente senhor de cabeça para baixo e temos uma pérola de sabedoria: o que é bom para os EUA [e Europa ocidental] não pode ser muito bom para um país do terceiro mundo, principalmente um abarrotado de petróleo como a Líbia!
ResponderExcluirAliás, Paulo, quem disse isso foi o Juracy Magalhães, militar posto para chefiar o Itamaraty no começo da Ditadura - como bem nos lembrou o Celso Amorim ao assumir a Defesa, quando perguntado "e se um militar fosse posto para chefiar o Itamaraty?". E o problema da Líbia é exatamente esse mesmo.
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