domingo, 27 de março de 2011

Crise Mundial: Reino Unido e Portugal

Manifestação gigantesca em Londres contra política de socialização de prejuízos - The Guardian

Ontem, quatrocentas mil pessoas saíram às ruas de Londres para protestar contra o plano anti-crise elaborado pelo governo britânico. O plano do gabinete do premiê David Cameron não passa de mais uma repetição da manobra mais batida entre manobras batidas do nosso tempo; cortam-se verbas para o financiamento de serviços essenciais como Educação e Saúde para cobrir um rombo cuja origem está nas próprias incongruências do sistema capitalista. Sim, o Capitalismo, como pontificou Marx há séculos, também tem seu movimento de sístole e diástole: O mesmo sistema que privatiza os ganhos socialmente produzidos é também aquele que socializa os prejuízos individualmente gerados - e isso é cíclico. 

No entanto, hoje, mais do que nunca, a Vida está posta em função do Capitalismo, o que só é possível pela existência de um Estado gigantesco que nos envolve a todos com sua política de exceção. Vivemos na era do cinismo em pessoa: O mesmo Governo Britânico, que está em guerra na Líbia por razões essencialmente imperiais - como o faz no Iraque e no Afeganistão há anos - também é o mesmo que alega não ter dinheiro para custear hospitais e escolas. Nada muito diferente da República Portuguesa que assistiu a queda do Governo Sócrates, há seis anos no poder, depois do Parlamento ter rejeitado um plano de recuperação similar ao refutado pelos britânicos nas ruas - embora aquele Parlamento não tenha decidido (e tampouco o fará) sair também da zona do Euro, o que faz com que aquela decisão seja apenas um capítulo do impasse na vida daquela república ibérica.

Se do lado português, a crise suscita a existência de um arranjo delirante do sistema europeu, constituído no fato de que países periféricos compartilham da mesma moeda usada por países como França e Alemanha, podemos dizer algo parecido do lado britânico: A bomba relógio monetária também aparece aqui, mas o faz na forma da superavalorização da Libra Esterlina. Para os países periféricos da Europa, o fato de  pertencerem ao sistema do Euro os torna dependentes de um ciclo de endividamento infinito possibilitado por um sistema de crédito com limites - para não verem suas contas explodirem imediatamente pelo déficit em conta corrente via balança comercial, aqueles Estados foram se endividando massivamente nas últimas décadas, mas pelo jeito a corda estouro. 


Já o Reino Unido, a pátria do eurocetismo, mesmo que não tenha entrado na Zona do Euro, também caiu numa arapuca monetária - aliás, a peculiar arapuca monetária *e cambial* britânica é o que explica o país não ter aderido à moeda comum europeia; falo aqui da maneira como a economia britânica se tornou mais e mais financeirizada, criando uma elefantíase do mercado de seguradoras, o que fez com que seguidos gabinetes mantivessem uma moeda incrivelmente valorizada, fato que somado aos custos das guerras nas quais o país se envolveu, gerou um rombo incontrolável nas contas do país. É preciso cortar em algum lugar, mas o que fazem, diante disso, os líderes britânicos e portugueses? Cortam verbas que iriam para hospitais e escolas. 

Nada muito diferente de líderes alemães e franceses que, enquanto motores do sistema monetário europeu, se acham profundamente espertos ao jogarem todo o ônus da crise sobre os seus vizinhos mais pobres, fechando as torneiras do sistema de crédito que eles próprios apresentaram aos portugais e grécias da vida como a garantia inabalável - e inesgotável - de viabilidade do Euro  - como se isso pudesse evitar uma contaminação sistêmica, via Euro, causada pela provável quebradeira geral que se avizinha no horizonte.

Isso, claro, sem falar em como a crise social e política na periferia da Europa irá lhes afetar. Não à toa podemos dizer que essa é, seguramente, a mais limitada geração de líderes europeus desde os anos 3o, algo sintomático em um momento no qual os partidos estão engessados na mais pura falta de criatividade e desconexão com a realidade social - a crise da esquerda partidária europeia está aí para nos provar isso. Ou a Europa produz novas saídas políticas - e Ed Miliband é uma esperança no Reino Unido - ou irá ser engolida pela crise. A implosão da União Europeia que se desenha é dos mais graves eventos que se pode conceber.

Um comentário:

  1. Ao conhecer seu espaço e gostei muito! bastante educativo, seleto e diversificado. Parabéns. A educação é a base do ser humano para sua vida em sociedade e para uma vida feliz. Também sou educador e vejo que nossa base holística é o caminho mais ameno a seguir, repleto de aprendizados diários em rumo a uma qualidade de vida equilibrada.
    Obs: Me tornei seu seguidor.
    Prof. José Carlos
    http://projetosead.blogspot.com/

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