Pnyx, o berço da democracia |
Há muito se fala na necessidade de ser feita uma"reforma política" no nosso país. A razão para tanto está, precisamente, nas muitas fissuras que se abriram em partes relevantes do sistema político desenhado pela Constituição de 1988, coisa que já era possível constatar logo assim que ele foi posto em funcionamento.
É claro que o buraco, para variar, é mais embaixo. A problemática do exercício do poder no Ocidente - e o Brasil não escapa a isso - vai muito mais longe. A tentativa de construção de uma democracia representativa não deixa de ser uma contradição em termos, embora a construção de quimeras raramente decorre de - tampouco volte-se para - meros enganos.
Pois bem. A reforma política foi tema recorrente da nossa última campanha presidencial com Dilma Rousseff, a atual presidenta, mostrando-se favorável à reforma - fazendo coro com Marina Silva, então candidata verde -, enquanto o conservador José Serra se limitava a defender o "voto distrital".
Dilma e Marina defendiam a reforma mediante uma "constituinte exclusiva", o que, já àquela época, apontávamos como fantasiosa e impossível: a reforma passaria obrigatoriamente pela dureza das negociações parlamentares, pois não havia meios jurídico-constitucionais vigentes para fazer diferente disso, seja no que concerne à produção de leis (complementares ou ordinárias) ou, sobretudo, às emendas constitucionais.
O problema, tal como posto, encontra dois tópicos da maior importância: um é a distância dos eleitores em relação aos legisladores que elegem e o outro a corrupção colateral que decorre, vejamos só, de acordos espúrios decorrentes do financiamento de campanha, em grande parte privado - embora juridicamente ele seja misto -, o que vincula de forma promíscua políticos eleitos de seus financiadores.
O sistema de voto proporcional com listas abertas adotado é frenquentemente incompreendido, seja por sua relativa complexidade ou por agravar mais ainda a fragilidade dos partidos, o que cria uma concorrência interna nos partidos e, por tabela, produz uma desinformação geral sobre seu funcionamento. Essa disfunção produz uma cultura de voto na figura pessoal do candidato em um sistema que se alimenta (ou deveria) na coerência dos partidos.
Votando na legenda ou não, temos um voto com dupla implicação, a primera, é a ida do voto, nas eleições parlamentares, para o partido do candidato e a segunda, por sua vez, é, em caso de voto em algum candidato e não na legenda, para o próprio candidato em relação aos seus colegas candidatos pelo partido. Assim, se um partido (ou uma coligação, o que está prestes a cair) elege 50 deputados, eles serão os 50 mais votados entre si.
Em resumo, o sistema força um efeito curioso, onde cada candidato à deputado ou vereador faz campanha para si mesmo e, ao mesmo tempo, os partidos são desobrigados a realizarem prévias internas para escolherem seus candidatos e, pior ainda, de apresentarem um programa sólido.
Figuras pessoalmente populares se destacam e o parlamento fica erodido, ainda mais em um cenário no qual a fidelidade partidária só veio a ser, razoavelmente, implementada há pouco. Por outro lado, campanhas, de um modo geral, custam caro, o que não é de se estranhar em uma sociedade do espetáculo.
Empresas têm dinheiro e nem sempre é possível um candidato prescindir delas - quando isso ocorre, é mais difícil ainda livrar-se dos compromissos políticos contraídos - legais ou não, embora grande parte dos casos de corrupção tenham relação com tal fenômeno, mas é preciso salientar que mesmo em um cenário onde não há ilegalidade, só o fato dos financiadores de campanha se tornarem super-eleitores, já é, por si só, um problema.
Dilma e Marina defendiam a reforma mediante uma "constituinte exclusiva", o que, já àquela época, apontávamos como fantasiosa e impossível: a reforma passaria obrigatoriamente pela dureza das negociações parlamentares, pois não havia meios jurídico-constitucionais vigentes para fazer diferente disso, seja no que concerne à produção de leis (complementares ou ordinárias) ou, sobretudo, às emendas constitucionais.
O problema, tal como posto, encontra dois tópicos da maior importância: um é a distância dos eleitores em relação aos legisladores que elegem e o outro a corrupção colateral que decorre, vejamos só, de acordos espúrios decorrentes do financiamento de campanha, em grande parte privado - embora juridicamente ele seja misto -, o que vincula de forma promíscua políticos eleitos de seus financiadores.
O sistema de voto proporcional com listas abertas adotado é frenquentemente incompreendido, seja por sua relativa complexidade ou por agravar mais ainda a fragilidade dos partidos, o que cria uma concorrência interna nos partidos e, por tabela, produz uma desinformação geral sobre seu funcionamento. Essa disfunção produz uma cultura de voto na figura pessoal do candidato em um sistema que se alimenta (ou deveria) na coerência dos partidos.
Votando na legenda ou não, temos um voto com dupla implicação, a primera, é a ida do voto, nas eleições parlamentares, para o partido do candidato e a segunda, por sua vez, é, em caso de voto em algum candidato e não na legenda, para o próprio candidato em relação aos seus colegas candidatos pelo partido. Assim, se um partido (ou uma coligação, o que está prestes a cair) elege 50 deputados, eles serão os 50 mais votados entre si.
Em resumo, o sistema força um efeito curioso, onde cada candidato à deputado ou vereador faz campanha para si mesmo e, ao mesmo tempo, os partidos são desobrigados a realizarem prévias internas para escolherem seus candidatos e, pior ainda, de apresentarem um programa sólido.
Figuras pessoalmente populares se destacam e o parlamento fica erodido, ainda mais em um cenário no qual a fidelidade partidária só veio a ser, razoavelmente, implementada há pouco. Por outro lado, campanhas, de um modo geral, custam caro, o que não é de se estranhar em uma sociedade do espetáculo.
Empresas têm dinheiro e nem sempre é possível um candidato prescindir delas - quando isso ocorre, é mais difícil ainda livrar-se dos compromissos políticos contraídos - legais ou não, embora grande parte dos casos de corrupção tenham relação com tal fenômeno, mas é preciso salientar que mesmo em um cenário onde não há ilegalidade, só o fato dos financiadores de campanha se tornarem super-eleitores, já é, por si só, um problema.
O Projeto de Reforma Política, relatado pelo deputado federal Henrique Fontana (PT-RS), foi enviado para a Câmara recentemente e foca nos dois pontos citados (além de mudança na data de posse, suplência de senador e mudanças no domicílio eleitoral): ele defende a alteração do sistema de voto proporcional em lista aberta para estabelecer um sistema com dois votos, o chamado "distritão misto" - um para o partido, outro para candidatos de forma unipessoal - sendo metade da lista eleita proporcionalmente à votação do partido (por listas fechadas) e a outra por seu desempenho pessoal; por fim, ele defende o financiamento exclusivamente público de campanha.
É fato que a proposta de alteração do sistema eleitoral para eleições legislativas é ruim. O distritão misto é confuso, não resolve os problemas do sistema atual e ainda é mais difícil ainda de ser compreendido. O financiamento exclusivamente público de campanha, por sua vez, é uma saída interessante e, à luz dos fatos, é uma proposta impressionante de tão boa.
A questão do sistema de voto misto, aliás, já é alvo de uma polêmica, uma vez que o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) propôs no começo do ano um projeto de lei favorável ao sistema distrital puro e, agora, o PSDB parece mesmo engajado em defender esse sistema de voto - depois de Aécio ter defendido o "distritão misto" no começo do ano. José Serra, recentemente, se pronunciou atacando o projeto de Henrique Fontana, chamando o distritão misto de "samba do petista doido", ignorando a influência de seu correligionário - e desafeto - Aécio Neves na elaboração da proposta.
Se o distritão misto é mesmo ruim, por outro lado, o voto distrital - alvo de uma campanha na Internet - é simplesmente horrível por vários motivos:
(1) o número de deputados estaduais é maior do que o número de deputados federais, logo, ou teríamos de aumentar o número dos segundos ou reduzir o dos primeiros - ou uma terceira hipótese absurda que seria a de termos um distrito para deputados estaduais e outra circunscrição para deputados federais na mesma eleição;
(2) O Brasil é um país demograficamente heterogêneo, logo, cidades grandes teriam de ser rachadas em vários distritos, enquanto cidades pequenas deveriam ser unidas. Nunca teríamos distritos certinhos, com uma proporção correta do eleitorado.
(3) O sistema de voto distrital abre espaço para distorções matemáticas. Por exemplo, em um país imaginário com 100 distritos, se um partido vencer por 100% dos votos em 50 deles, ele terá o mesmo número de cadeiras que seu adversário, que venceu na outra metade por 50,1% dos votos. Mas nem precisamos de um exemplo hipotético tão teratológico, basta lembrar das últimas eleições britânicas, nas quais houve uma distorção absurda dos votos: se os conservadores tiveram apenas 36% dos votos contra 29% dos trabalhistas e 23% dos liberal-democratas, a distribuição dos votos por distritos fez com que os conservadores ficassem com 47% das cadeiras contra 39% dos trabalhistas e apenas 8,8% para os liberal-democratas. Sim, um partido pode conseguir a maioria das cadeiras sem vencer entre os eleitores.
(4) Restaria saber quem e - principalmente - como seriam divididos os distritos - e também quem e como se faria a permanente contagem populacional dos eleitores de cada distrito. Isso, nos EUA, sempre alvo de problemas, com circunscrições eleitorais sendo definidas por interesses de políticos e interesses poderosos para, inclusive, prejudicar minorias étnicas que, por um acaso, estavam concentradas em certas regiões de alguns estados - sobretudo os negros no sul. Eram construídos distritos artificiais, verdadeiras costuras, para impedir que representantes negros fossem eleitos. Existe até uma expressão para essa prática: gerrymandering.
(Enfim, se tem gente por aí que diz ser a favor do voto distrital puro porque "ele elegeu Churchill", eu sou contra porque isso atrasou em anos a eleição de representantes negros nos parlamentos dos Estados Unidos)
Estranho, embora explicável, é a contrariedade de Serra ao financiamento exclusivamente público de campanha. E com argumentos de que isso favoreceria PT e PMDB. Errado, essa bem-aventurada proposta petista favoreceria os pequenos partidos e ainda por cima diminuiria a promiscuidade da relação partidos-empresas. Quem sairia prejudicado é quem tem mais conexões com o capital, precisamente os grandes partidos como PMDB e PT - mas talvez em maior medida o PSDB, o que torna seu posicionamento explicável como coloquei inicialmente, embora seja um sofisma dizer que os dois maiores partidos governistas sairiam favorecidos.
Como se não bastasse, o que Serra e Aloysio talvez ignorem, quem sabe por não olharem atentamente o número de prefeituras pelo país, é que quem sairia fortalecido de um sistema distrital puro são, justamente, os partidos que ainda controlam currais eleitorais e não aqueles que, bem ou mal, estão propondo projetos (como o PSDB): em outras palavras, se Serra e Aloysio estão tão preocupados assim com o crescimento do PMDB, eles não deveriam defender o voto distrital, uma vez que é aquele partido o mais enraizado no interior brasileiro e, por tabela, o mais favorecido.
Ironias do destino, o voto em lista fechada, sempre defendido pelo PT é aquele que mais ajudaria o PSDB, hoje, a reverter sua trajetória de queda na votação para a Câmara. Na medida em que os tucanos lançam candidaturas e são quem, de fato, antagonizem com algum peso contra o PT, é provável que se o partido da estrela até aumentasse sua bancada, por outro lado, seria o PSDB e não o PMDB a vir logo atrás dele. Relativamente, é provável que a base governista até diminuísse com o sistema de voto que o PT defende. Olhando o sistema de lista fechada destacado do impacto no mundo partidário, ele seria mesmo a melhor saída, embora sem obrigação legal de realização de prévias, nada feito.
Em outras palavras, a referida reforma política segue atolada e não há de se esperar grande coisa. O debate é construído nas altas cúpulas, longe das ruas, o que toma um caráter dramático quando levada em consideração a aparente esquizofrenia das propostas tucanas, os interesses rasteiros do PMDB nisso tudo e a escravidão do PT em relação à sua burocracia e, mais ainda, em relação ao sistema parlamentar falido e uma base governista heterogênea e instável.
Só um movimento muito forte vindo da sociedade poderia produzir uma mudança, mas nenhum partido tem interesse em movimentar isso e as organizações políticas não-partidárias têm pouca ou nenhuma força - as que tem, notem, estão vinculadas de certa forma aos partidos como no caso dos sindicatos.
Aí chegamos à matriz do problema da democracia representativa: ela não nasce neste ou naquele modelo de representação, mas sim na clivagem fundamental da modernidade, a saber, não apenas a redução da pólis à sociedade - um grupo atomizado, unido por interesses variáveis -, mas que essa própria sociedade está cindida permanentemente; de um lado, a sociedade política - o Estado, seus burocratas, seus líderes eleitos (nas democracias) todos em menor ou maior rotatividade -, do outro, a sociedade civil, lar dos cidadãos, aqueles que são identificados como parte do todo político, mas não são vistos como ativos do ponto de vista da governança.
Se na Antiguidade o civens (cidadão) era apenas a palavra latina para o grego politikón (político), a modernidade considera os dois termos não como sinônimos, mas como instrumentos conceituais diferentes que, entretanto, se unem para dentro da mesma escala de hierarquia para opera-la. Se a Revolução Francesa por um lado trouxe a universalização da cidadania, por outro lado, ela se deu esvaziada de seu conteúdo; o cidadão tornou-se tão somente uma identidade, passivo e posto para fora da esfera decisória como qualquer súdito.
Em outras palavras, os problemas que levam o Brasil a buscar uma reforma política - e os mesmos que atravancam tal processo - têm implicações muito mais profundas; se o Estado de Exceção é regra geral em nosso tempo, isso se dá não apenas porque o Capitalismo - e o posterior estado de guerra civil global produzido pela globalização - reforçam o autoritarismo por meio da dissolução da política pela exaltação do Governo, mas sim porque antes deste momento, a própria construção política contemporânea já parte de uma premissa na qual quem ela inclui no corpo da cidade é incluído como separado.
Olá, Hugo!
ResponderExcluirConfesso que nessa discussão eu tenho muito mais dúvidas que certezas. Eu já quase comprei a ideia do voto distrital ou, pelo menos, de um modelo misto, em parte sob influencia da imprensa que, pelo menos aqui em São Paulo, volta e meia defende esse sistema. Mas comecei a mudar de ideia em 2006, quando assisti, na FESPSP, um professor daquela entidade, que é uma escola de Sociologia e Política, defender o modelo proporcional por este oferecer menores obstáculos a expressão política de entidades de classe pouco representadas e minorias. Não saí de lá convencido das vantagens do voto proporcional, mas passei a ficar bastante desconfiado dos possíveis efeitos _ positivos ou negativos _ de uma reforma política. Imagino que não exista sistema perfeito. Ainda mais em um país _ tudo bem, não é exclusividade nossa _ onde grande parte dos eleitores acredita que político, e partido político, é tudo igual. Apenas tenho certeza de uma coisa, eleições para cargos públicos devem ser financiadas com dinheiro público e, no máximo, com o trabalho voluntário de correligionários e eleitores simpatizantes.
Estava escrevendo um post a respeito, mas ando sem tempo. Pena que não haja muitos artigos na internet sobre sistemas eleitorais, ou pelo menos que façam uma abordagem mais didática. Um deles, sobre voto proporcional _ e que também não é lá muito didático _ encontrei neste endereço, um site jurídico.
Abraço!
Olá, Edu, há quanto tempo, meu velho! Como colocado, não existe um sistema eleitoral perfeito - ou melhor, útil - porque ele se baseia numa lógica de representação. A reforma política tal como está posta não caminha na direção da construção de mecanismos de participação, portanto, falamos de reconfigurações do mesmo.
ResponderExcluirIsso não quer dizer que as coisas não possam piorar, é claro. O problema do voto distrital é que candidatos que representam minorias e posições polêmicas, dificilmente conseguiriam ser majoritários em uma determinada circunscrição. Além de todos os problemas práticos da implementação do modelo como elencado exaustivamente no post.
Sendo bastante pragmático, no que toca ao sistema eleitoral, ou se deixa como está ou se implementa sistema de listas fechadas com obrigatoriedade legal de eleição da lista pelos filiados - e não por delegados.
Agora, financiamento (exclusivamente) público de campanha é o tipo da coisa que não é possível ser contra, a menos se assumirmos a boçalidade como regra geral.
um abraço
Hugo,
ResponderExcluirParabéns pela clareza de argumentos. Coisa meio rara ultimamente...
Concordo com boa parte do que você diz. O voto distrital puro tem realmente todos esses problemas citados (e talvez mais alguns...), e o "distritão misto' é um bicho feio de doer.
Agora minha discordância principal. Não consigo entender a repulsa de muitos à Constituinte Exclusiva. Sério, todos os argumentos que me apresentaram até agora me pareceram formalistas demais (gostaria de ver os seus). Penso que só um instrumento desses seria capaz de fazer uma reforma com começo, meio e fim, além de poder adotar medidas que nunca passariam pelo Congresso (qualquer Congresso, não especificamente o atual), como repensar a proporcionalidade das bancadas dos estados e o próprio tamanho do Congresso e das Assembléias estaduais.
Meu sistema favorito? O distrital misto, mas não da forma totalmente estanque que alguns defendem (metade pelos distritos e metade proporcional, com dois votos independentes). Me atrai o sistema usado nas eleições do Parlamento da Escócia (na Alemanha é bem parecido). O país foi dividido em regiões (aqui se usariam os estados), e dentro de cada região existem distritos correspondendo a aproximadamente 50% das cadeiras. O eleitor vota duas vezes: no candidato do distrito e na lista da região (ou estado). Para definir as bancadas, somam-se os dois votos e cada partidos recebe uma bancada proporcional a seu desempenho. Essa bancada será integrada pelos candidatos eleitos nos distritos acrescida de quantos membros da lista foram necessários.
Ou seja, na prática é uma eleição proporcional com uma distrital dentro. Evita a esmagadora maioria dos problemas do distrital puro e obriga que cada partido se esforce dentro de todos os distritos (sem deixar nenhum relegado).
Quanto ao problema do tamanho dos distritos, se adotado o sistema que proponho, e mesmo sem mexer no tamanho do Congresso, os distritos ficariam, em média, com 800.000 habitantes. Só temos 22 municípios no Brasil maiores do que isso. Dá para contornar...
Desculpe o "jornal", e um abraço.
Luiz,
ResponderExcluirNão existe, no direito brasileiro, uma figura chamada "constituinte exclusiva", ou se constitui tudo ou se altera as partes necessárias - e mecanismo para tanto, nós já temos, é a emenda constitucional, que pode mudar tudo, exceto as cláusulas pétreas (que tratam, precisamente, de direitos fundamentais e itens caros ao próprio Estado brasileiro).
Para criar um novo mecanismo de alteração do texto, precisaríamos produzir uma nova emenda - ou seja, reformar do jeito antigo para chegar ao novo. É possível fazer assim? É, mas isso abre uma caixa de pandora, porque, restaria saber quem seria legítimo para emendar a Constituição dessa forma, quais suas atribuições e como isso se daria.
Seria um salseiro jurídico e, não duvide, seriam os direitos sociais os mais ameaçados. Se isso fosse feito de qualquer jeito, então, poderíamos realmente estaríamos dando um tiro no pé, porque se dá para mexer de qualquer jeito na Constituição, então dá para fazer tudo - e cada grupo ia tentar emplacar seu plano brilhante de qualquer modo.
A julgar pela correlação de forças da política nacional, estaríamos abrindo um flanco importante que se sustenta na legitimidade dos procedimentos constitucionais de alteração do próprio texto da Carta Política.
Sobre o sistema de voto, eu já levantei a hipótese da adoção do voto distrital misto para contemplar a necessidade de representação territorial com a programática, mas hoje também não encampo essa proposta não.
Não é tão simples assim delimitar distritos - não seria tão simples juntar municípios e dividir outros - e, como eu coloquei no meu post: a quantidade de deputados estaduais é bem maior do que a de deputados federais, como contornar isso? E como contornar a possibilidade de um partido ter maioria de cadeiras sem, necessariamente, ser o mais votado? Ademais, observando o funcionamento de Reino Unido, EUA e Chile, nada aponta para uma melhora da representação, mas apenas um flanco para para distorções e um perfil tacanho e provinciano na representação - ainda que a melhor representação possível ainda seja uma representação, portanto, como eu disse, o buraco aqui é mais embaixo mesmo. Pragmaticamente: ou deixamos o sistema como está por meio do fortalecimento da fidelidade partidária ou instituímos lista fechada com obrigação de prévias internas entre os filiados para ordena-la.
abraços
Hugo,
ResponderExcluirEntendi suas preocupações quanto à Constituinte Exclusiva. Entendi, mas não sei se concordo totalmente.
Quanto ao distrital misto, vamos por partes:
- O número dos deputados estaduais é bem maior HOJE. Não signiica que precisa continuar assim. Se for definido que o número de cadeiras de cada Assembléia será igual ao número de vagas do estado na Camara Federal acrescido de um número fixo pequeno, poderíamos igualar os distritos das duas eleições e o restante dos estaduais seria eleito pelo proporcional.
- No sistema misto como eu descrevi, o partido mais votado terá sempre mais cadeiras, já que a distribuição total será proporcional.
- Mais tacanho e provinciano do que é nosso Senado é seria um pouco difícil, concorda?
Mas, concordo, o assunto é vasto e complexo, e o buraco é mais embaixo.
Abraços.
Luiz,
ResponderExcluirTentando ser mais claro: (1) Não existe previsão de constituinte exclusiva e não é possível (juridicamente) mexer na Constituição sem um mecanismo existente; (2) Precisaríamos criar esse meio para operacionaliza-lo na Reforma Política pelos mecanismos atuais de alternação do texto; (3) Terminologicamente, uma constituinte exclusiva é quimérica, é como falar em meia gravidez; (4) Se a questão é fazer um no mecanismo de reforma, é o caso de ver se isso é possível, eu temo que não, posto que o prazo para rever os artigos da Constituição expirou em 1993; (5) Mesmo que fosse possível, a questão é como faríamos para garantir que isso fosse um processo limpo e onde acharíamos os justos para redigir tal reforma; (6) O Precedente é perigosíssimo, traríamos novamente para a arena da discussão política tudo que já foi debatido, confrontado e cuja resultante estão expressas nos dispositivos constitucionais. Vale a pena? Não.
De fato, fiz referência ao sistema misto baseado em uma divisão meio a meio do Parlamento - com metade sendo eleito pelos distritos e outra pela lista -, o que, realmente, abre espaço para um partido menos votado ter a maior bancada com uma distorção grande - levando em consideração que no nosso sistema, é possível um partido ser menos votado e ter mais cadeiras pela proporção de deputados por estados, mas isso não é tão radical quanto em um sistema distrital.
O seu modelo é temperado e contornaria parte do problema da proporção, mas ainda assim daria um peso maior aos distritos - porque a lista complementaria aquilo que não foi eleito pelos distritos - e não contornaria justamente o problema maior do sistema: o distritalismo não força os partidos a se esforçarem por todas as regiões, mas sim que as candidaturas adotem um perfil comum a eleições majoritárias, portanto, mais recuado, buscando agradar ao eleitor médio.
Hoje, é possível se eleger deputado com posições polêmicas, num sistema distrital dificilmente, essa posição precisaria ser majoritária em um distrito.
O fato de existir uma assimetria (constitucional) entre o número de deputados estaduais e federais iria obrigar a, junto da eventual aprovação do voto distrital, ser feita uma engenharia complexa e de resultados duvidosos. O quem e o como dividir os distritos seriam a pior parte - ainda mais com a heterogeneidade do país e as constantes mudanças demográficas.
E o Senado é efetivamente tacanho porque é uma casa legislativa eleita por votação majoritária. Isso favorece quem controla grotões e, no lugar de gente de ideias, frequentemente são eleitos figuras com responsabilidades meramente regionais para votar leis que, em último caso, valem para todas as regiões e raramente dizem respeito a pautas geográficas - e se forem regionalizadas as pautas nacionais, aí sim, teremos um pandemônio.
Eu temo que uma Câmara eleita com voto distrital - misto ou, principalmente, puro - caminharia para ser tão ruim quanto é hoje o Senado. Teríamos uma pequena câmara de prefeitinhos.
abraços