O meio das grandes corporações midiáticas reflete uma unidade ideológica tão coesa seja na escolha do "que" ou de "como" difundir a informação que um espectador ingênuo pode supor que os chefes de redação dos jornalões e os diretores dos telejornais sejam a mesma pessoa. Além de não existirem divergências ideológicas, também raramente assistimos a exposição de conflitos de qualquer natureza entre tais grupos, ou melhor, famílias - mas quando vemos isso, nos deparamos com algum imbróglio causado pela luta imediata pelo poder.
Recentemente, a jornalista da Folha Elvira Lobato divulgou por meio de uma série de reportagens a suposta ligação de igrejas evangélicas com o crime organizado, em especial com a lavagem de dinheiro. Em consequência disso, ela foi processada por vários fiéis da Igreja Universal em várias partes do país ao mesmo tempo. A Folha disponibilizou advogados e sua defesa se estruturou na alegação de litigância de má-fé. Desde então, a tensão entre a TV Record, de propriedade do mesmo de Edir Macedo, líder da IURD, e a Folha. Teria a Folha ofendido a honra dos fiéis da IURD ou teria ela divulgado fatos comprometedores? Mais que isso: O que teria motivado a Folha a fazer essas reportagens? O fato dela ser sócia de uma Globo que não engoliu até agora a Record News?
Retaliação para cá, retaliação para lá, a Record bateu no calcanhar de aquiles da Folha nesse momento: A ditabranda. Entrevistou torturados, mostrou vídeos da época, uma beleza. Entrevistou, inclusive, Ivan Seixas, que foi protagonista do de um dos episódios mais bizarros da época da ditadura. Ivan, para quem não sabe, foi preso aos dezesseis anos junto com seu pai, Joaquim Seixas, por conta do suposto envolvimento do Seixas pai com o assassinato do industrial Boilesen, presidente da Ultragas e financiador da famigerada Operação Bandeirante (OBAN), o ponto mais alto do terrorismo de Estado no Brasil; depois de um processo implacável de torturas, seu pai acabou morrendo, mas não sem antes os torturadores mostrarem para Ivan uma reportagem de um jornal indicando que seu pai havia morrido poucas horas antes disso de fato acontecer. O jornal: A Folha Tarde, de propriedade do Grupo Folha, conhecido na época como o "diário oficial da OBAN" porque gozava de informação privilegiada da referida operação decorrente, quem sabe, de uma eventual simpatia que seus proprietários nutriam em relação a tudo aquilo.
Essa reportagem do Jornal da Record, claro, tem muito pouco de defesa da Democracia e muito mais de uma manifestação daquilo que pode se tornar mais comum nos anos que virão: O aumento do conflito entre grupos de mídia decorrente do aumento de poder político deles. O que aconteceu aqui foi o uso puramente seletivo da verdade; tais fatos foram trazidos à luz porque convinham para Record, assim como as reportagens da senhora Lobato eram convenientes naquele momento. É a boa e velha luta pelo poder, mas numa perspectiva onde sequer cabe a máxima de que os fins justificam os meios; aqui, os fins, por eles próprios, já invalidam os meios sejam eles quais forem. É uma briga que eu, pessoalmente, declino em apoiar alguém.
Hugo,
ResponderExcluirApesar dos interessas da Record passem longe de uma defesa da verdade e da Democracia, é muito bom que divergências entre grandes grupos midiáticos resultem em reportagens onde versões diferentes sejam apresentadas ao público. Não da pra ficar do lado de nenhum desses veículos, pois cada um deles age de acordo com seus interesses, mas acredito que os telespectadores da Record ganharam com esse briga. E a Folha merecia uma resposta como esta, como merecia...
De fato, Eduardo, vai ver no fim das contas foi a coisa certa feita pelos motivos errados - aliás, pelas atuais circunstâncias, a Folha acabou perdendo a parada, Otavinho conseguiu enfraquecer demais o jornal com as sua falta de habilidade.
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