sexta-feira, 8 de abril de 2011

A Tragédia do Rio

Intervenção artística na esquina da Rua Bartira com a M. Gonçalves Foz - Perdizes, São Paulo, próximo à PUC-SP

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A Tragédia de ontem no bairro carioca do Realengo foi anunciada. Se tem uma coisa que a filosofia contemporânea nos ensina é que as notícias demoram a chegar - mas um dia, elas chegam. Aqui, a tragédia causada por um jovem fundamentalista com problemas mentais que, como numa típica chacina americana, massacrou uma dúzia de crianças na escolas que estudou é só reflexo de algo que, há muito, acontece em nosso meio: a americanização da nossa sociedade, a reprodução - cada vez mais intensiva - de uma forma de recalque comum àquela máquina capitalista, produzindo efeitos semelhantes; o aumento dos casos de obesidade, de viciados em drogas - sobretudo antidepressivos - e, também, de chacinas desse tipo - "anômicas", dirão os partidários da analítica - não são fruto do acaso. Temos um tal nível de regulação da nossa vida, um grau tão agudo de normalização que, ora ou outra, produzirão jovens transtornados que farão algo do tipo. São todos panelas de pressão humanas com suas válvulas de escape entupidas, a explosão é certa - como é certo também que para compreender isso daqui, é preciso que nos livremos dos psicologismos e sociologismos vãos para pensarmos sobre a coextensividade entre o campo social e o individual.  Como nos lembra o grande Murilo Duarte Costa Corrêa - ao tratar da Carta a um Crítico Severo de Deleuze -, o si é a dobra interior do mundo. A vida sem saída, a vida interditada que nos sufoca não é um fenômeno físico ou lógico, não está no dentro ou no fora, mas sim na dobra que há entre ambos os campos, o que só pode ser desdobrado por uma Ética efetiva - e efetiva é a Ética concebida tendo em vista os devires e não os deveres e, voltada, por fim, a tentar desdobrar a problemática entre o Eu e o Mundo. Trocando em miúdos, não há como pensar nesse caso sem pensar o que há dentro da cabeça do atirador e, ao mesmo tempo, no que vem de fora e lhe faz agir assim: Ou melhor, a relação entre uma coisa e outra. É uma forma de economia que produz isso. Sim, senhores, estamos diante de algo mais trágico do que parece.



12 comentários:

  1. É huguinho, zezinho e luizinho... Dia difícil o de ontem, tragédia com grandes doses de crime de ódio contras as mulheres também, a Lola escreveu um post muito bom hoje sobre o assuto também que vale a pena ser lido.

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  2. "a americanização da nossa sociedade"

    Cara, com todo o respeito, parei ali. E dali não passo. Fala sério, viu?

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  3. Luka,

    Eu acho que esse acontecimento foi mais complexo do que isso. Eu acho que o foco aí é a figura da escola e, sobretudo, a maneira como o indivíduo preso em uma espécie de camisa de força social explode. Aqui, ele matou mais meninas, mas em casos similares nos EUA, o atirador privilegia outros tipos - os atletas e alunos "populares", os professores, os funcionários etc. Isso tem menos a ver com mera moralismo machista e mais com o que se passa no inconsciente.

    beijo

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  4. relances,

    Você tem todo direito de não passar por onde não quiser, querido. Quem sou eu para ser a má consciência de alguém? Ademais, que a nossa cultura foi minada por uma progressiva assimilação da cultura americana, isso, me desculpe, me parece certo. Desde a língua inglesa ou a lógica de disputa social - a divisão entre fracassados e perdedores substituindo gradualmente o cordialismo etc -, a própria música, só para ficar pelo começo. Esse crime aí não me parece ter muito paralelo com a nossa cultura, não?

    abraços

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  5. Por mais estranho ou politicamente incorreto que seja, eu entendo o Wellington. Ao que parece, ele sofreu bullying quando estudava, em especial por parte das meninas. Eu também. Havia momentos que desejava a morte de certos colegas. Felizmente, não sou fanático religioso a ponto de realizar, de prontidão, um ato como esse.

    Esse rapaz não foi um 'monstro' como muitos alardeiam, mas sim uma pessoa como eu e você, que teve muitas frustrações na vida e não teve oportunidades para apaziguá-las...

    Como dizia Renato Russo em Índios, 'vivemos num mundo doente', e cada vez mais re-alimentado pelo ódio. Nesse mundo, viver não faz mais sentido.

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  6. Exato, Luis. Eu acredito mesmo que temos de fugir ao julgamento moral do que aconteceu, é mais ou menos a conversa deste post. Isso não é uma questão de bem contra o mal, tampouco um fenômeno isolado. Por que crianças cada vez mais jovens fazem bullying contra seus coleguinhas? E por que precisamos de uma palavra inglesa para definirmos esse fenômeno mesmo? Qual a dinâmica de relacionamento social que tem se enraizado nas escolas? E a questão do fundamentalismo religioso? Essas são algumas das peças do quebra-cabeça dessa conversa toda. É preciso entender o novo mecanismo de recalque que tem se instalado - por meio da assimilação de padrões econômicos e culturais, diga-se - na nossa sociedade para lutarmos contra ele - é a vida sem saída da foto. Aí teremos um debate verdadeiramente sério.

    abraço

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  7. A questão do fundamentalismo religioso também deve ser incluida nessa análise. A carta dele era toda inspirada no levitício, livro mais violento da bíblia.

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  8. De certa forma, ela já está Bosco: a religião - em suma face extremista - é um dos arcaísmos aos quais a máquina capitalista recorre - a americana bastante, diga-se de passagem. Quem sabe por ser mais intensa. Quando eu falo desse processo de assimilação, essa é uma das pontas soltas.

    abraço

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  9. Achei inteiramente inadequado o Sérgio Cabral chamar o assassino de animal e psicopata (termo médico usado indevidamente como xingamento), o que me soou totalmente falso (partindo dêle é a norma) e revelando uma tentativa de se mostrar em sintonia com a previsível indignação popular, ou seja, jogando para platéia como sempre. Sincero pesar pela morte das crianças? Passou longe.

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  10. Marola, sim, concordo. Mas eu não espero nada melhor do Cabral - tristeza a política carioca atual, não?

    abraço

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  11. Hugo,
    É uma americanização de um comportamento, evidente.
    O pior é a corrente de comentários e justificativas que vem se tentando apresentar, repisar teorias, e um monte de baboseiras sensacionalistas.Tratando-o como um animal, monstro muito fácil julgá-lo e tratá-lo como alguém longe da humanidade inata a todo homem.É clarividênte que esse garoto tinha algum transtorno mental, como muitos que por ai possuem.

    Acho que acontecem violências desse gênero a todos tempo, cada uma vista, e sabatinada conforme a oportunidade.Evidente que não menosprezo a dor e a tragédia, mas até que ponto há dor e sentimento por esses momentos??
    Não há uma banalidade na vida e sacralidade na morte?Quando o inverso é que deveria ser o ideal?
    beijos

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  12. A melhor coisa que li na internet sobre a tragédia. Fiquei muito comovido.

    http://osiascanuto.blogspot.com/2011/04/tragedia-em-realengo.html#links

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