terça-feira, 24 de março de 2009

Democratização da Mídia: Perspectivas

Um assunto recorrente nesse humilde blog é o constante questionamento sobre as ações da chamada "grande mídia" nacional - a reunião dos grupos hegemônicos desse poderoso setor - e a permanente investigação sobre qual será o futuro da Mídia em escala global. Não resta dúvida que a relação entre difusão de informação e poder é cada vez mais imediata - iria até mais longe: Por ora, apenas o sistema financeiro mundial consegue se apresentar como um ator político de peso superior, mas com essa Crise Mundial e a forma como ela se desenrola, talvez isso mude.

Isso não só pode como já está causando mudanças significativas: Se antes as forças clássicas, isto é, o Estado, o capital industrial, os partidos, o povo e os intelectuais formavam, mediante seu perene confronto, a narrativa histórica, hoje são as grandes corporações midiáticas que estão assumindo essa função, não apenas como algo que é movido, mas como algo que se move - e o faz cada vez mais autonomamente.

Em seu estado de desenvolvimento inicial, o sistema midiático acabou se desenhando primeiramente em um modelo que se materializava em inúmeras pubicações escritas à serviço de partidos, sindicatos, movimentos sociais, universidades e afins - e algumas empresas destinadas apenas a esse fim. Nos fins do século dezenove e início do século vinte, surgem as novas tecnologias que maximizam a potencialidade de difusão da informação: O rádio, o cinema e a televisão. É também uma época de grandes narrativas que disputaram a consciência da humanidade e que nesse caminho criaram modelos totalitários de difusão de informação: As empresas privadas e profissionais de difusão no mundo capitalista que seguem uma lógica de concentração e oligopolização e, do outro lado da cortina de ferro, as gigantes estatais empenhadas em fazer propaganda do partido único - e, talvez, um meio-termo na Europa Ocidental com tipo sistemas mistos e a existência de concessões públicas, o que se enveredou para o Brasil de maneira levemente distorcida.

Hoje, com o fim do bloco socialista e a globalização capitalista, o que vemos é o predomínio das grandes corporações midiáticas globais que trespassam o tecido da comunidade internacional e concentram cada vez mais poder. É nesse tempo e nesse mundo que a necessidade de se criar estruturas que permitam o controle público e democrático - não estatal ou burocratóide - da difusão da informação nos é jogada na cara. É nesse tempo e nesse mundo que as corporações lutarão até a morte para evitar isso, usando desde sua capacidade ímpar de conquistar corações e mentes até argumentos manjados como "isso ameaça a liberdade de expressão" - como se a liberdade dos cidadãos do mundo de terem liberdade de informação não fosse relevante. É também nesse tempo e nesse mundo - só que mais precisamente na Argentina -, que surge uma raiozinho de sol nesse sentido: O Projeto de Lei de democratização da mídia da presidente Cristina Kirchner que visa, entre outras coisas, pôr fim aos oligopólios midiáticos assim como banir de vez certos ditames oriundos da época da ditadura militar daquele país.

É, como eu disse, apenas um raiozinho de sol, mas não podemos nos esquecer que mesmo o mais singelo feixe de luz - desde que devidamente refletido - pode gerar uma faísca com a qual podemos acender uma chama, quem sabe, a chama da Democracia. A esse respeito, é provável que tenhamos uma Conferência Nacional de Comunicação aqui no Brasil este ano. Será que não seria uma bela oportunidade para discutirmos esse tema tão caro à construção da Democracia no nosso país? Será que esse não é um belo exemplo?

PS: A esse respeito melhor escrevem o grande Idelber Avelar e mais alguns bons nomes cujos links constam em sua recente postagem.

3 comentários:

  1. É uma oportunidade única, mas pelo que li no comentário da Cláudia, no em recente post do Idelber citado por você, os parlamentares ligados aos grandes grupos midiáticos nacionais já estão mexendo seus pauzinhos para tentar "diluir" as discussões durante a Conferência Nacional de Comunicação.

    Não estou muito inteirado no assunto, mas seguindo alguns links a respeito da proposta do Governo Argentino para o setor de comunicações tive a impressão de que a legislação lá _ Na Argentina _ é mais centralizadora que a brasileira. Vou esperar pelas informações prometidas pelo Idelber, mas parece que as chances desse projeto passar não são muito animadoras. Ainda que só a sua discussão já seria um ganho para a sociedade.

    Particularmente, eu sou cético quanto alguma mudança na legislação brasileira sobre radiodifusão. Pelo menos com os atuais parlamentares. Minha grande esperança é a internet. Por isso projetos como o do Senador Azeredo me preocupam imensamente.

    Dentro de alguns anos estaremos diante da internet 3.0, com velocidade muito maior do que temos hoje e com possibilidades inimagináveis. Já é possível criar programas no You Tube, até existem alguns, mas esta possibilidade será ampliada dentro de quatro ou seis anos. A portabilidade dos computadores _ inclusive via celular _ prometem diversificar tanto as fontes de informação e entretenimento que as grandes corporações midiáticas precisaram mudar muito para conseguirem sobreviver. Tudo bem, pode ser que eu esteja sofrendo de alguma espécie de delírio futuristico, mas as coisas caminham para isso. pelo menos é isso que eu espero.

    ResponderExcluir
  2. Repetido a minha resposta à Flávia, no Conversa de bar, o governo Lula perdeu uma grande oportunidade de "rever" alguns pontos na lei de concessões durante a regulamentação da TV digital. Seria possível ampliar o número de canais que poderiam ser transmitidos em cada faixa de sinal digital, o que ampliaria consideravelmente o número de emissoras, mas aceitaram as exigências dos empresários da comunicação e mantiveram tudo como estava, com a desculpa de garantir "maior qualidade de imagem".

    Agora Inês é morta? Ainda não, mas não veremos esse tema ser discutido pelos grupos que tradicionalmente dominam a imprensa brasileira. Eles certamente tentarão impedir qualquer debate sobre reformas que diminuam seu poder de formadores da opinião pública.

    Caberá a nós, blogueiros, levantarmos o debate e dar a ele a amplitude que precisa ter. Isso se não nos calarem antes, como parecem querer fazer.

    ResponderExcluir
  3. Eduardo,

    Não, não é um delirío futurístico não, acho que é bem por aí mesmo. No entanto, ainda que a tendência da mídia seja uma convergência para Internet, creio que debater a questão da gestão dos meios convencionais é uma bandeira de luta interessante que serviria, inclusive, para marcar posição nos debates sobre questão à Internet.

    Temos hoje um bom naco da mídia (televisão, rádio e publicações impressas) oligopolizado e apenas uma alguma possibilidade de expressão pela Internet. Com a mídia convencional oligopolizada, é possível uma lei como essa do Azeredo passar sem sequer ser mencionado por jornais, noticiários e afins. Democratizar esses meios mais antigos seria, por incrível que pareça, uma maneira de ampliarmos o discurso de defesa da liberdade na Internet para além dela própria - até que isso fosse assegurado e o próprio avanço tecnológico levasse a superação desses meios pela Rede (paradoxal, não?)

    No que toca o governo Lula, é a velha questão da Plutocracia, meu caro Eduardo; o PT lança mão de uma política de conciliação desde que entrou no poder, em certos momentos ela acertada porque equilibra as coisas num país tão complexo quanto o nosso, em outros, ela dá errado porque cai naquela coisa de fazer concessões desnecessárias para conseguir alguns avanços simples.

    A Constituição de 88, por mais que tenha resultado em um avanço significante, não conseguiu instituir verdadeiramente a Democracia no país na medida em que não criou meios sustentáveis para o nascimento e o crescimento de um sistema político-partidário sadio.

    Quando o PT resolveu entrar no jogo, ele acabou fazendo certas concessões para poder, de algum modo, alterar a realidade. Nisso, claro, ele passou a correr riscos e se contaminou com certas "doenças" inerentes a esse sistema. Se essa queda valeu a pena pelos avanços conseguidos, só a História dirá, mas o que fica agorinha, no calor do momento, é o de que ele deixará um legado bem controverso - positivo, se comparado com os demais governos e negativo se comparado com as potencialidades e do compromisso histórico do partido e da esquerda brasileira.

    abraços;

    ResponderExcluir