sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Ahmadinejad, PSOL & Marina e a Candidatura Dilma

Pois é, tudo isso daí, de alguma forma se interliga. Aliás, como quase tudo que acontece no Brasil de hoje, tudo isso gravita em torno da figura do PT e de Lula - seja por inevitável atração magnética ou porque, de algum modo, alguém ligou isso a eles de forma arbitrária, desconexa e eleitoreira: O PSDB, principal agremiação da oposição à direita, se tornou uma espécie de contra-PT; desde que o projeto neoliberal foi para o vinagre no país (e agora no mundo), o partido do tucanato se viu perdido, não passa de um organização pautada pelo que o Governo faz, dirigindo-lhe uma crítica normalmente desqualificada. Por sua vez, a oposição à esquerda, no lugar de desenvolver um progama suficientemente coeso para servir de antítese ao projeto petista, acabou por ser apenas e tão somente contrário a tal projeto - notem as sutilezas da dialética, esse é o problema do PSOL. Alguns fatos que aconteceram ao longo da semana são bastante emblemáticos no que concerne a essa problemática político-partidária. São eles a visita do presidente iraniano Mohamed Ahmedinejad e a aproximação do PSOL à candidatura Marina Silva.

A visita de Ahmadinejad

Na visita do presidente iraniano Mohamed Ahmadinejad bastante disso veio à tona. Criticar o chefe de Estado por receber um líder estrangeiro chega a ser absurdo; a argumentação purista de que não deveríamos recebê-lo é patética, se fossemos lidar apenas com modelos bons de Democracia, acabaríamos por romper relações diplomáticas até mesmo com os EUA.

Curiosamente, os mesmos que tiveram essa ataque histérico com a vinda de Ahmadinejad são aqueles que calaram para o fato de que Presidente de Israel também ter sido recebido dias antes - e são os mesmos que criticam o Ministério da Justiça por ter concedido status de refugiado a Cesare Battisti; talvez sejam os mesmo que ignoram o fato de que foram aceitos no país guerrilheiros bolivianos de direita que se envolveram na recente agitação anti-Governo em Pando.

Aliás, não posso deixar de assinalar o quão jocoso foi o fato da Folha de SP chamar o candidato à Presidência - e Governador de São Paulo nas horas vagas - José Serra para escrever um artigo criticando o Governo brasileiro por receber Ahmedinejad. Uma prova do grau de partidarismo a que chegou a nossa mídia corporativa e, ao mesmo tempo, um demonstrativo do nível de desespero do candidato Serra.

Temos de um lado, portanto, uma mídia pautando a oposição à direita que parece mais perdida do que cego em tiroteio e um demonstrativo das de quais tipos de interesse realmente gravitam em torno da candidatura Serra.

Marina e o PSOL


Em um primeiro lugar, eu acredito que o PSOL é um ator que pode ser extremamente importante para a Democracia brasileira. O PT, admitam ou não, tornou-se uma agremiação de centro-esquerda. Enquanto isso, outros partidos menores ocupam a extrema-esquerda. Resta um vácuo bem no meio disso e era aí que o PSOL deveria estar - até porque não há nenhum partido ou movimento que ocupe esse espaço. No entanto, o Partido se perde na sua profunda fragmentariedade.

Aliás, dentro do PSOL há consensos entre seus membros sobre as discordâncias, mas há poucos consensos que façam a agremiação rumar na direção de um projeto suficientemente coeso e congruente. É necessário que o partido entenda o que diabos significa ser contraditório a um determinado projeto e diferenciar isso da mera contrariedade: Ser contraditório a um muro é atuar com ele de maneira a supera-lo, quem sabe arranjando uma escada ou uma corda para tanto; ser contrário a um muro é encostar sua cabeça nele e empurrar bem forte para que ele caia.

Dentro desse contexto, Heloísa Helena, ex-candidata à Presidência pelo PSOL há três anos atrás, surpreendeu e, enquanto os seus correligionários discutiam - e prosseguem discutindo - o lançamento de uma candidatura própria, ela resolveu declarar apoio à candidatura da ex-petista Marina Silva, o que representou um duro golpe para o Partido, tanto pela forma como isso foi conduzido quanto pela materialidade do que aconteceu: A candidatura Marina não representa uma opção mais à esquerda de Dilma, ao contrário, ela está, quando muito no mesmo nível - enquanto nas questões concernentes às liberdades individuais está atrás, bem atrás.


Isso é bastante complexo porque apesar de HH ter tornado um ícone em um dado momento sobre as mudanças internas do PT - e até da truculência desse processo -, ela também nunca foi exatamente um arquétipo de lutas pelas liberdades individuais, se pautando por uma visão de esquerda cristã não muito progressista nesse sentido
. Assim, a situação atual longe de revelar as contradições internas do PT, aponta para as contradições psolistas.

As Eleições Presidenciais


As recentes pesquisas para as eleições 2010 apontam para um crescimento da candidatura Dilma e uma queda da de Serra. O ponto central é que na medida em que mais eleitores declaram sua intenção de voto, menos Serra cresce, o que aponta para uma direção na qual uma transferência de votos de Lula para Dilma é cada vez maior. Em outras palavras, o PT prossegue pautando o jogo político no país e os seus adversários não sabem como reagir a isso; Dilma não é uma figura ainda tão conhecida e já está apresentando resultados impressionantes.

Seria isso bom? No que toca a Democracia brasileira não é - e a explicação para isso é a forma pela qual esse processo está acontecendo. O PT governa sim com muitos méritos, tem números bons para apresentar e ainda uma base de comparação muito fraca para trás, mas o que o Partido tem para apresentar em termos de transformação para o futuro, não é muito; a resolução das contradições internas do Partido, desde o fim da dicotomia entre petistas puros x infiltrados gira em torno da questão do partido escolher entre a via socialista ou via social-democrata. A Carta ao Povo Brasileiro foi, na verdade, um documento suficientemente relevante nesse debate.

As crises das estruturas do Partido quando do Governo Lula e a sua dificuldade em lidar com as instituições - o que é um problema da esquerda mundial -, enfraqueceram o Partido da Estrela enquanto agremiação política. Nada, no entanto, foi tão nocivo quando a existência de uma oposição tão desqualificada, seja lá dos lados que estejamos falando; a falência crítica de ambos os lados que cercam o PT colaboram para que ele seja um partido pior.

Ademais, o PT continua, de certa forma, escravo de um certo pragmatismo vulgar e lhe faltam grandes teóricos; aqueles que ocupam suas posições estratégicas seguem a lógica de funcionamento sindical, mas não de chão de fábrica, mas sim da estrutura do sindicato; faltam quadros capazes de ter uma leitura mas profunda e ampla do Estado e da Economia ao mesmo tempo em que essa organização impede a formação desse tipo de político em seu interior. Isso não é nada bom, pois pode marcar a absorção definitiva do PT ao sistema em poucos anos - talvez dentro do prazo de um eventual Governo Dilma.

Conclusão:

Enfim, são questões para se refletir, pois elas ilustram o grau da crise em que se encontra o sistema político-partidário brasileiro que a despeito dos avanços sociais vistos no país nos últimos anos, está em crise; tais avanços, diga-se de passagem, paracem cada vez mais decorrer de um processo inercial às reivindicações e construções feitas na surdina da resistência à Ditadura Militar.

Atualização de 27/11 às 22:48: Absurdo o texto que César Benjamin escreveu hoje para a Folha acusando Lula de tentativa de estupro quando foi preso pela ditadura. Eu considerava Benjamin um sujeito capaz intelectualmente, só que com algumas posições extremadas que suscitavam certo desequilíbrio, certa inconstância - e isso ficou claro quando ele foi candidato a vice de Heloísa Helena em 2006 e rompeu com ela durante a campanha (?!). Agora, esse texto é um atestado de insanidade, por mais que haja má-fé nele - e existe -, não me parece algo escrito por alguém com condições mentais normais, não mesmo. A maior carga de má-fé nisso tudo, no entanto, vem da gloriosa Folha de SP, um jornal que a cada dia se supera mais para bater seus recordes de canalhice pretéritos: Mas desde que a candidatura Serra entrou em crise conseguiu descer ainda mais nos ataques que faz contra o atual Governo. Não que depois do episódio da Ditabranda, eu duvidasse de mais nada, é só mesmo um lembrete mesmo. Aliás, o post do Azenha sobre o caso resume bem o que eu penso sobre tudo isso.


2 comentários:

  1. Acho impressionante essa crítica à visita do presidente do Irã. Os EUA podem receber e ser aliado do ditador que for (Marrocos, Egito, ARÁBIA sAUDITA), ou seja, os EUA podem lutar pelos seus interesses nacionais. O Brasil tem que pedir autorização para os EUA para lutar pelos interesses nacionais. É obvio que é do interesse das Grandes Potenciais que nós do Terceiro Mundo só comercializemos com ele e não entre si. Mas, brasileiros aceitarem esse absurdo é um absurdo total. O Lula podia responder, quando os EUA romperem relações com as diaturas nós rompemos também. Ora, o Irão é um grande mercado em potencial e pronto.

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  2. Sim, sim, meu caro anônimo. Essa crítica é absurda e não apenas do ponto de vista comercial: Politicamente, trata-se de um erro muito grave isolar ou romper com um país que nada lhe fez diretamente - a ideia da manutenção do diálogo, mesmo em momentos difíceis, deve ser um norte permanente, pois é a única forma de mudar quem quer que seja. O que aconteceu foi que a oposição à direita do Governo transformou isso em um fato político de uma maneira cínica e desproporcional, o que revela sua falta de rumo - assim como fez e faz em relação à (digna) posição brasileira em Honduras.

    abraços

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