quinta-feira, 19 de maio de 2011

Palocci e o Governo Dilma

Palocci sob pressão
A Casa Civil, desde  a chegada de Lula ao poder, voltou a ter centralidade que não tinha há tempos, passando a ser o centro nevrálgico da articulação do governo - em todos os sentidos, seja com os ministérios ou com o Congresso Nacional. Embora seu ocupante tenha status de ministro, aquele órgão, não custa lembrar, é parte da estrutura da própria Presidência da República. Uma vez colocado o chefe da Casa Civil em tal posição de relevo - somado ao fato do PT governar sob um modelo de coalizão profundamente heterogêneo e complexo -, o seu chefe ocupa uma posição de destaque junto ao debate público - como estiveram em certo momento José Dirceu, a atual Presidenta e, agora, Antônio Palocci. Portanto, os atuais escândalos envolvendo seu ocupante, ora denunciado pela mídia em virtude de um suposto enriquecimento ilícito, não são pouca coisa. 

O ex-prefeito de Ribeirão Preto, Antônio Palocci, aliás, foi uma surpresa enorme no Governo Dilma, ainda mais por sua queda, anos atrás, no Ministério da Fazenda com o escândalo Francenildo - onde, pelo que foi provado, sabia da quebra de sigilo de um caseiro que o denunciava enquanto ele era bombardeado por denúncias. Palocci, não resta dúvida, é uma figura controversa; ele galgou inúmeras posições na hierarquia petista ao ser um dos principais articuladores da eleição de Lula em 2002 e, depois, arcando com o ônus de substituir o falecido prefeito de Santo André, Celso Daniel, que era visto como o natural ministro da fazenda de um governo petista. Suas posições, no entanto, sempre confundiram e desagradaram a base petista, muito aquém de uma social-democratização do Estado, surgiam políticas de austeridade sem a devida preocupação com a alavancagem do crescimento econômico. 

Ninguém, dentre os ocupantes de posições de destaque dos governos petistas, esteve sob tanto fogo dos próprios correligionários quanto ele; a imagem de Palocci sempre foi incômoda aos petistas na medida em que ela se configurava quase como a de um Tony Blair dos trópicos: um arauto da mesma política que seus adversários só que com a devida face humana; mas se na terra da rainha, Blair criou um novo trabalhismo com base em uma agenda social-liberal, cá no Brasil a vida de Palocci, dentro de um estrutura tão complexa quanto a do PT, sempre passou longe de ser fácil; se FHC sempre vendeu o seu peixe de que as opções que decidiu pôr em prática nos anos 90 eram o único caminho possível, Palocci nunca discordou muito disso, sua proposta era apenas de fazer isso mais bem feito - o que não difere muito da posição em que Blair estava em relação aos seus adversários conservadores e ao thatcherismo.

Ainda que não seja um grande orador ou um político simpático, a influência paloccista dentro do Governo cresce a olhos vistos, ainda mais sob a chefia de uma pessoa com formação essencialmente administrativa como Dilma Rousseff, ressentida de modo insanável de vocação política. Se Lula, um político nato, dependia da capacidade gerencial dos seus chefes da Casa Civil, qualquer que seja o ocupante de tal cargo no atual governo manterá relação inversa com a Presidenta. Portanto, é provável que Palocci tenha mais poder hoje do que Dirceu ou a própria Dilma jamais tiveram son Lula

Também não nos parece ser coincidência que a ascensão de Rui Falcão à presidência do PT tenha antecedido em poucos dias tais denúncias; aqui, o recado é claro: incomoda ao partido a influência de Palocci, seja pela forma como ele exerce sua liderança - construída nitidamente por cima - ou pelo que seu projeto significa.Procuramos nos manter céticos sob os demais impactos da presidência de Falcão, mas é fato que ela passa pela reconstrução do campo majoritário petista - cindido em vários pedaços e unido pela figura de Lula - para que o partido tenha coesão suficiente para pautar Dilma e costurar alianças, isso muda a correlação de forças dentro do Governo e fulmina as (grandes) pretensões de Palocci sim - embora não se saiba se com a força suficiente. 

Certamente, a chegada de Falcão não implica na (necessária) democratização que o PT precisa para arcar com as consequências das mudanças que ele próprio produziu, mas isso não quer dizer que tenha lá (alguns poucos) efeitos positivos, dentre eles, evitar que o Governo Dilma acabe navegando num mar incerto e seja levado pelo vento. Já alertávamos há meses para os problemas que Palocci, apesar das forças de bastidores, teria tanto para exercer seu cargo quanto para executar seu projeto; agora, o que está em jogo é tanto menos a veracidade das informações veiculadas, mas os rumos que o Governo Dilma irá tomar.









9 comentários:

  1. Concordo plenamente: o Governo Dilma, que já demonstrava fraqueza sob vários aspectos (vide dificuldade para impor nomes, mesmo para cargos de segundo escalão, como diretorias de estatais, IPEA etc.), tende a se tornar cada vez mais refém do PT.

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  2. Bem, o Governo Dilma não é refém do PT, mas sim um governo do PT; a questão aí é outra: dado o caráter heterogêneo do partido, qual rumo ele vai tomar? E a dificuldade, meu caro, é inerência de qualquer governo num país como o nosso...

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  3. Aliás, seria interessante uma matéria sobre a forma pela qual tem sido negociados e escolhidos os nomes para o segundo escalão. A meu ver, a medida da fraqueza do governo Dilma pode ser inferida pela incapacidade de impor sua vontade em relação a questões menores; por exemplo, não ser capaz de tirar o péssimo economista Marcio Pochmann do IPEA é um vexame para a presidenta.

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  4. Verdade, a dificuldade encontrada por Dilma para governar é inerente a qq governo. O que eu quis dizer foi que ela não é um quadro do PT e não necessariamente compartilha das ideologias do partido. Sua visão me parece muito mais pragmática. Mas, da forma como as coisas caminham, ela vai acabar tendo que abraçar as bandeiras do partido.

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  5. Bom, a Dilma não poderá dizer que foram imprevistos de seu governo. Colocar o Palloci lá foi assumir esse tipo de impasse. Era óbvio.

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  6. Mas pode ser também (e é o mais provável) que ela não teve lá muita opção... Me assusta o poder desse grupo político que comanda o PT, e consequentemente o Brasil, e tudo que são capazes de fazer.

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  7. Hugo, sua análise me parece correta e oportuna: o novo necessita da retomada de uma vida desburocratizada e com militância do PT; Palocci representa o monolitismo de um grupo que coloca na corda bamba os sonhos de transformação... Abraços com carinho, Jorge Bichuetti
    www.jorgebichuetti.blogspot.com

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  8. Jorge Bichuetti, você vai me perdoar, mas "vida desburocratizada" e "militância do PT" são termos incompatíveis entre si.

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  9. Anônimo 1: Eu penso o contrário, a julgar pela complexidade do arranjo partidário-parlamentar do PT, Dilma se saiu bem na composição dos ministérios.

    Anônimo 2: O PT é muito mais difuso internamente do que se pode supor. A perspectiva de Dilma é compartilhada por muitos setores do partido.

    Ândi: Sim, desde o começo eu acredito que Palocci foi uma péssima escolha e, no fim das contas, é melhor para o governo que ele caía - e isso aqui é sanção política, judicialmente é outra conversa e acusações precisam de provas.

    Jorge e Anônimo 3: Sim, o PT precisa se desburocratizar, mas não sei se a saída de Palocci, nessas condições, seria um indicativo disso - pode representar uma melhora em termos materiais, mas não formais -; agora, a vida do PT foi a luta da base contra a burocracia, quem não conhece essa tensão, não conhece a história do Partido dos Trabalhadores.

    abraços

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