domingo, 20 de março de 2011

Quando Estamos Sós: Líbia

Retirado do excepcional Fractal Ontology
O filósofo lituano-francês Emmanuel Lévinas construiu sua vasta obra a partir de um diálogo permanente com a Tradição do pensamento ocidental, embora o fizesse construindo uma nova perspectiva segundo a qual a Filosofia Primeira foi reposicionada na Ética: A Filosofia - nascida enquanto discurso de dominação e fundada no Ser, uma unidade totalizante que desvaloriza as diversidades - deveria estar fundada na Ética, pois só assim a abertura em direção ao Outro seria possível e a vida poderia ser garantida. Reflexão natural de um homem que, como ele, sofreu na pele as agruras dos totalitarismos do Século 20º, seja quando vai para a França poucos anos depois da Revolução Russa - e as nuvens negras que se anunciavam para os judeus ainda não tinham precipitado, mas já se anunciavam no horizonte com o Stalinismo em gestação - ou mesmo quando é enviado como prisioneiro para um campo de concentração nazista na Alemanha depois da ocupação francesa - onde se depara com a expressão máxima da degeneração da máquina social humana, um sistema que além de opressor já tem como sua diretriz básica a eliminação prévia de determinados grupos como forma de atingir uma purificação geral.

Eu discordo de uma série de pontos da filosofia de Levinas, seja no que toca à influência da fenomenologia em sua obra ou sua concepção de infinito notadamente cartesiana, mas suas reflexões sobre a condição do homem diante da desdita, quando ele se vê abandonado diante da morte, me encantam - e o mesmo eu poderia dizer em relação à proposta central de seu pensamento. Existe uma passagem sua que me faz refletir profundamente à luz do clarão dos bombardeios que a OTAN promove, neste exato momento, sobre a Líbia"Deus que vela sua face não é, pensamos, uma abstração de teólogo nem uma imagem de poeta. É a hora em que o indivíduo justo não encontra nenhum recurso exterior, em que nenhuma instituição o protegeem que a consolação da presença divina no sentimento religioso infantil se nega também, em que o indivíduo apenas pode triunfar em sua consciência, ou seja, necessariamente no sofrimento" - sim, agora mesmo, essa é a situação na qual se encontra a multidão líbia, só a imagem de um Deus ausente lhes consola em meio ao fogo cruzado entre uma ditadura clinicamente paranoica e entre uma coalizão bélica com um senso de oportunidade único. A loucura do coronel Kadafi usada como trampolim da guerra justa que, em último caso, servirá para estacionar tropas no Magreb e frear manu militari o processo revolucionário que eclodiu na região. 

Dessa vez, não é o Stalinismo nem o Nazismo, apenas mais daquilo que assistimos reiteradas vezes desde 2001: O Estado contemporâneo, máquina de hemodiálise suprema e triunfante do Capitalismo atual - em relação ao qual a própria Vida está posta em função - e cuja face é um certo universal profundo; o sorriso largo de Obama esconde a formidável miragem na qual se constitui o Universal, posto como realidade apriorística, quando, concretamente, não passa do fruto de uma síntese passiva na qual certa força tornou um modo universalizável em um modo universalizado. O Universal que Obama ostenta enquanto hegemon é uma forma vazia na medida em que sua existência no discurso só serve para apontar o que ela mesma esconde, ou seja, sua própria causa determinante - isto é, a própria força causante. Para além desse raciocínio spinozano, basta voltarmos a Levinas e estamos diante de outro exemplo de Ser Totalizante. Nesse vazio cabe tudo exceto a diferença. Desde a reabilitação de Kadafi há poucos anos até sua nova transformação em tirano global - que ele nunca deixou de ser, ressalte-se.  Como se fará a Paz Universal das potências globais? Esse é o problema.

Em um situação onde os rebeldes se viam massacrados pela longeva ditadura Kadafi, quem se apresentou em sua defesa foram, ironicamente, aqueles que nos últimos anos financiaram e apoiaram aquela tirania - e fizeram o mesmo com todas as ditaduras vizinhas -, portanto, o alvo não poderia ser aquele regime, mas a própria mobilização contra sua existência moribunda. Não há salvação nem saídas fáceis. É provável que Kadafi - um peão nesse jogo todo - matasse todos rebeldes de forma cruel, portanto, não é possível torcer por nenhuma saída que não seja a sua derrubada - e dessa forma, eu não me ponho contra a resolução formal da ONU, cujo conteúdo material, claro, nada mais é do que a vontade e o poder da OTAN -, mas também não é possível ser favorável a ela de modo algum - nem ao que está acontecendo e, mais importante, ao que ainda vai acontecer. A luta agora é impedir mais mortes e garantir que a democracia não seja freada na Tunísia e no Egito ao menos. Quem o fará? Resta a questão. Em um mundo onde a anestesiado e em transe como o nosso, é difícil saber.


18 comentários:

  1. Eu também sou a favor da ofensiva contra Kadafi (que nesse momento na sua paranoia acha que está lutando contra nazistas, Al Qaeda, imperialistas, etc, etc).

    Alguns colegas meus defendem intervenção "imperialista" zero pois "povo unido jamais será vencido", infelizmente isso é muito teórico... fora que tenho dúvidas se meus colegas (uma parte, é claro, pois heterogênos) não apoiariam uma intervenção de URSS ou Cuba, o que a meu ver daria no mesmo, substituindo a CIA pela KGB.

    Inclusive tenho um pé atrás em chamar a ONU de imperialista, pois me parece mais imperialista pela sua passividade do que pela sua força: seus, programas, seu exército entram em países não para implantar a globalização, mas para que a globalização se implante pelos governantes locais. E quando os setores da ONU que cuidam da fome/alimentação ou do meio ambiente alertam para os malefícios da globalização eles não tem força para nada.

    E pensando bem, nem rompi a minha coerência ao apoiar a intervenção: minha crítica ao Bush, ou ainda ao ataque de Israel contra Gaza não foi baseado só no anti-imperialismo, critiquei os ataques pois não tinham aval da ONU, ou melhor, iam frontalmente contra a ONU. E quando os generais deram golpe em Honduras (posteriormente disfarçado com a desculpa de continuidade das eleições), torcia para que os EUA não aceitassem o regime, e não para eles não darem opinião alguma (a intervenção zero). Brasil rejeitou prontamente e até abrigou o presidente na embaixada, e ninguém chamou a atitude brasileira de imperialista.

    Posso até estar sendo ingênuo, pois o que envolve tropas e guerra nunca é uma ação apenas de abrigar os feridos, acho que essa intervenção a um passo de ser imperialista, mas eu apoio sim.

    OBS: há fragilidade no meu raciocínio principalmente porque não considero a ONU imperialista mas digo que a OTAN é com certeza. Contudo, meus colegas também têm uma fragilidade: iam balançar suas opiniões se a OTAN aceitar Cuba como um dos membros...

    ResponderExcluir
  2. Resumindo seu belo texto: estamos no mato sem cachorro.

    ResponderExcluir
  3. Eu discordo do Célio pois esta intervenção na Líbia mata o processo revolucionário contra Kadafi que estava em andamento.

    ResponderExcluir
  4. Celião, em si, a ONU não é nem poderia ser imperialista - mas exatamente o contrário -, só que suas limitações - diria até lógicas -, acaba tornando-a uma mera forma cuja materialidade são as próprias potências mundiais e sua necessidade de legitimarem racionalmente sua atuação - embora em alguns momentos isso falhe, como no caso da invasão do Iraque em 2003. A questão, claro, não é formal. O ponto é que Kadafi era mais um ditador financiado pelo Ocidente até que esse belíssimo movimento multitudinário se levantou, derrubou dois ditadores locais e o derrubaria, eis que ele agiu de forma insana - como sempre - e as potências ocidentais conseguiram o álibi que precisavam para um objetivo que, longe de implicar em justiça, diz respeito à eliminação de um aliado inútil para frear o processo da Revolução Árabe. Por vias tortas, Kadafi está fazendo jus ao financiamento que tem recebido nos últimos anos, pois provocou a situação que seus financiadores precisavam neste exato momento. É uma situação complexa, na qual não é possível, claro, pensar em outra coisa senão na derrubada da tirania líbia, mas também não há como ser ingênuo sobre a função à qual se presta isso tudo.

    abração

    ResponderExcluir
  5. Zatonio,

    Na verdade, estamos cercados por um monte de cachorros sem mato para se esconder.

    abraço

    ResponderExcluir
  6. Luis,

    De fato, é nesse alvo que a invasão mira, mas o próprio processo revolucionário - no caso específico da Líbia - já estava sendo esmagado com algum êxito por Kadafi, enfim, eles o tiranete deles, lhes deu um bom álibi.

    abração

    ResponderExcluir
  7. Nem a favor nem contra, igual a postura do Brasil. O que isto significa? Não se faz nada. Chega uma hora que tem se posicionar, não fazer nada é adotar um lado. Outra questão se Kadafi massacrar os rebeldes acabou a revolução em toda os países árabes e do norte da Africa.

    ResponderExcluir
  8. Carlos Souza,

    Nem a favor nem contra, igual a postura do Brasil. O que isto significa? Não se faz nada -- Embora você tenha razão que isso resulta na escolha de um lado, ele não é necessariamente o de Kadafi e nada nem ninguém é obrigado a escolher entre as duas opções de uma dicotomia falsa. O que o Brasil precisava ter feito desde o início era tomar uma posição favorável aos revolucionários em todo o Magreb e ter articulado no plano internacional isso na medida das nossas (infelizmente limitadas)possibilidades. Apoiar essa invasão é bobagem, afinal, com ou sem nós, ela aconteceria - e seu fim tampouco tem a ver com apoio aos rebeldes, mas sim com a defesa dos interesses ocidentais naquele país. Agora, uma vitória de Kadafi seria a supressão da revolução na Líbia, mas a vitória de uma coalizão ocidental é um verdadeiro movimento reacionário que, aí sim, ameaça a Tunísia e o Egito.

    ResponderExcluir
  9. Tenho sérias inquietações, Hugo, quanto a premissas do seu texto tão bem elaborado.

    Que é tomar por certeza o discurso que Gaddafi retomará o território e massacrará todos os rebeldes. Me parece que é exatamente esse o pilar do discurso humanitário, bem como da justificação da intervenção mais ampla, muito além da zona de voo restrito.

    Sim, ele vai continuar massacrando de uma forma ou de outra. Mas não tomo por verdade que a retomada do território signifique a derrota dos revolucionários líbios.

    A multidão tem mil e uma formas de reorganizar a luta. Quantas revoltas não se converteram em guerrilhas? Outra opção é o refúgio no Egito, quem sabe para organizar uma força expedicionária. E cadê a coordenação em rede dos movimentos do Magreb?

    Essa potência faltou ao movimento rebelde, que optou por clamar pela dádiva divina. Talvez isso signifique o sucesso de Gaddafi impor o medo, o reino do terror, ao estilo do tirano clássico, de Creonte. Os revolucionários estão sendo derrotados menos por motivos militares, do que por um problema de percepção e afetos. Toda a virada da campanha militar tem a ver com a reorganização de afetos e medos tão bem conduzida pelo tirano.

    Isso me remete ao primeiro tomo de "Multidão", de Negri e Hardt, onde eles falam das novas lutas pós-fordistas. No Egito e na Tunísia, não se constituiu um exército popular, e isso foi decisivo para confundir a contrarrevolução. Quando os rebeldes líbios se organizaram como exército popular, ainda que estropiado, à semelhança dos farroupilhas ou dos mexicanos de Pancho Villa, tudo começou a ir mal.

    As lutas deixaram de atravessar diagonalmente o estado e as forças armadas, e Gaddafi pôde rearticular seu discurso em termos transcendentes, unificando o múltiplo e reduzindo a potência dos muitos. Ele capturou o processo.

    Toda essa intervenção no fundo sedimenta a dobradinha de transcendências, o que fecha em definitivo, a meu ver, o processo constituinte na Líbia. Agora, só outra revolução, outra coisa, pode escapar da captura definitiva por um lado ou pelo outro.

    Tudo isso é trabalho da contrarrevolução, num nível molecular.

    Abraço.

    ResponderExcluir
  10. Bruno,

    Eu posso estar enganado, mas Kadafi - que nos últimos dias já tinha retomado pontos importantes - poderia avançar para leste e, se não ferir de morte os rebeldes, ao menos causar um belo estrago - ele, diferentemente de Mubarak ou Ben Ali mostrou que não só tem meios como uma disposição ímpar para matar como prova, p.ex., o caso emblemático do bombardeio aéreo contra uma multidão de manifestantes.

    Os problemas aí estão no próprio movimento revolucionário local, movido por um desconforto acumulado em décadas e pela inspiração dos países vizinhos, mas que, como você mesmo colocou, se articulou de um modo antiquado e fadado ao fracasso. E a disposição de matar a ponto de implodir o país, provocando uma invasão estrangeira, já era algo implícito na fala do filho de Kadafi em entrevista para a Al Jazeera.

    Como eu respondi ao Carlos logo aí acima, não discordo que a multidão líbia tivesse meios de se rearticular; a invasão em curso não apenas sufoca a revolução num nível líbio como ameaça seriamente o futuro de seus vizinhos, o que não aconteceria caso a Líbia não fosse invadida - posto que Kadafi apenas sobreviveria, mas não ameaçaria as aspirações de seus vizinhos. Ao meu pensar, qualquer uma das variáveis locais implica em mortes.

    abraço

    ResponderExcluir
  11. Tem razão Hugo, a ONU acaba sendo apenas a máscara racional das ações do Ocidente. Nesse ponto concordo com Luis Henrique de que a intervenção atrapalha a revolução árabe: (em 3 passos) entrar junto com a ONU, a OTAN dá um indevido passo além e por fim a diplomacia ocidental firma acordo pela "democracia".

    Mas esse roteiro não está definido, ainda há chance da ONU sair fortalecida pois diferentemente do Iraque, dessa vez se entra junto com a ONU e não passando por cima dela. Brasil tem cadeira na ONU, o jogo ainda pode ter contornos interessantes (me vem à cabeça o post passado do Descurvo). Os EUA ainda têm a chance de mostrar respeito à ideia de coletividade das nações, ainda que o COP-15 tenha sido uma boa chance para isso e eles tenham ignorado as recomendações da ONU para o aquecimento global...

    A despeito da esperança, eu estaria sendo bobo de dizer que não há dose imperialista nisso da ONU. Dos 3 passos que citei acima, a ONU está no primeiro e dificilmente ela impedirá que outros dêem os indevidos passos além. Mas por questões humanitárias, continuo apoiando a intervenção contra Kadafi.

    Se a ONU tivesse dado um grande soco na cara dos israelenses na agressão a Gaza, eu não chamaria a intervenção da ONU de imperialista, eu teria aplaudido.

    Eu sei, eu sei, a ONU em si não é, mas quem está com ela... sabem, confesso que tem raízes na minha infãncia e juventude essa minha posição. Quando criança contaram para mim que mataram muitos judeus e por isso criaram uma país para eles chamado Israel para eles ficarem menos tristes. E na juventude, pós-muro de Berlin e otimismo da ECO-92, via as vinhetas na TV Cultura sobre as intenções da ONU e pensava que após deixarem de brincar de fabricar mísseis nucleares na guerra fria, o mundo iria se unir pelas metas coletivas. Adulto, vejo Israel violando recomendações da ONU (na minha cabeça -e talvez cultura- inconcebível pois Japão continua fiel ao Ocidente após ajuda para se reerguer, e portanto Israel, que não tem nem 100 anos devia ter gratidão eterna aos defensores de direitos humanos), e vejp também fracassos da COP-15...

    O que o Ocidente deve fazer é prender Kadafi e levar à corte de Haia (sem execução, como fizeram com Saddam) e deixar os árabes decidirem seu próprio rumo (mas sem ser omisso se for virar uma guerra civil vide Ruanda). Talvez ingênuo, mas é o que defendo.

    Quanto à revolução, a questão é que parei de considerar como axioma a regra "povo unido jamais será vencido" e "os poderosos podem matar flores mas não deterão a primavera". Infelizmente com as armas atuais, o povo pode ser derrotado e com uma hecatombe nuclear a primavera nunca mais chegará...

    ResponderExcluir
  12. Prezados,

    A meu ver, quanto mais desacreditado e cínico se torna o CS-ONU, mais o Brasil tenta participar do 'club'. A ONU não representa só os EUA, mas todo um establishment: grandes corporações, sistema financeiro, organismos de mediação e gerência globais e estados-nações, na medida de seu poderio econômico/bélico/cultural.

    A invasão do Iraque em 2003 e a política neocon maniqueísta podem ser lidas como um golpe monárquico dos EUA contra essa ordem aristocrática. O restabelecimento relativo da ONU, devido ao fracasso das experiências americanas no Iraque e Afeganistão, não significa que seja mais legítima do que a monarquia americana, mas sim menos centrada num decisionismo soberano.

    Mas não vejo por qual artimanha seja possível reconhecer legitimidade, ou mesmo qualquer forma de autoridade moral, ao CS-ONU. O único fiapo de consentimento que ele obtém vem do humanitarismo, que se alimenta da má-consciência da maioria. Como não agem e se sentem impotentes para agir, apostam em outros para agir por eles, para "fazer alguma coisa".

    Bons tempos quando Orwell ou Apolônio de Carvalho partiam com uma força expedicionária internacionalista.

    Sou da opinião que é preciso construir uma governança global além desses organismos pós-2ª Guerra, e que essa construção depende das lutas mundializadas, tão potencializadas pelas redes sociais e novas formas de organização, --- como as que tentamos apreender com a revolução 2.0 no mundo árabe.

    Abraço.

    ResponderExcluir
  13. Mais sangue por petróleo

    Basta lembrar o histórico recente de ações e omissões da ONU para desconfiar das análises que defendem os bombardeios à Líbia. As forças de segurança agem, agora como antes, de acordo com os anseios geopolíticos das potências econômicas mundiais. A preocupação humanitária não foi capaz de mobilizá-las contra o genocídio em Ruanda, por exemplo. As dezenas de ditaduras “aliadas” jamais provocaram os valores democráticos da polícia mundial. As populações de países pobres em riquezas minerais continuam abandonadas à própria sorte, não importando a virulência de seus governos.

    A abstenção brasileira na sessão que aprovou o ataque foi correta porque demonstrou que nossa diplomacia está ciente dessas contradições, negando-se a endossar discursos hipócritas e uma investida temerária de resultados incertos para o Brasil, para o povo líbio ou mesmo para o avanço dos Direitos Humanos no planeta. Depois das farsas criadas para invadir o Iraque ou o Afeganistão qualquer postura diferente seria submissa ou irresponsável.

    Alguém de fato imagina que mísseis lançados a quilômetros de distância sobre áreas urbanas populosas conseguirão poupar inocentes? As conseqüências de uma guerra civil (massacres, destruição, êxodos) justificam a derrubada eventual de tiranos com fortunas protegidas em contas bancárias na Europa? Todos os apoiadores de Gaddafi (nacionalistas, por exemplo) devem ser dizimados? E se as forças rebeldes começarem a torturar e fuzilar idosos, mulheres e crianças? Serão bombardeadas também?

    Essas indagações espinhosas surgirão daqui a pouco, assim que as coisas saírem do controle. Os comentaristas alinhados a Washington podem ir preparando algumas respostas para evitar o vexame de outras ocasiões trágicas em que lhes faltaram prudência e verdadeiro espírito solidário.

    http://guilhermescalzilli.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  14. Pessoal,

    Valeu pelos excelentes comentários, amanhã vou tecer uns comentários sobre alguns pontos deles.

    abraços gerais

    ResponderExcluir
  15. atualizações importantes:

    -Brasil foi contra a resolução da ONU, defendendo o diálogo, é um caminho interessantíssimo, o eixo está mudando e saindo do velho esquema Europa-EUA.

    - segundo YahooNotícias, os rebeldes se sentiram decepcionados com Brasil e elogiaram França, mas os reporteres ouviram as pessoas da zona que tá caindo bombas, portanto acho natural que tenham uma visão muito dicotômica sobre os países do "bem" e o "mal" (o "bem" evita que bombas caiam daqui a 5 minutos na cabeça deles!). Eles estão sós, remetendo ao título desse post do Descurvo. Cabe a nós que não estamos ameaçados por bombas fazer uma análise com as nuances desse tabuleiro, quem é o bem, quem é o mal? Brasil? França? Inglaterra? China? OTAN?

    - o ditador do Iêmen (32 anos no poder) acabou de dizer que ficará no poder para evitar guerra civil em seu país. LEMBRANDO QUE SANAA, A CAPITAL, SERÁ A PRIMEIRA CAPITAL DO MUNDO QUE FICARÁ SEM ÁGUA DAQUI A 4 OU 9 ANOS, OU SEJA, ESTÁ CHEGANDO A ERA DAS GUERRA PELA ÁGUA! (por incrível coincidência, hoje -22- é o dia da água, vi pelo blog do Sakamoto, na barra lateral!)

    ResponderExcluir
  16. Célio: Obrigado pelas informações. Sobre sua posição em relação à intervenção da Líbia, eu a respeito plenamente, embora discorde dela e também agradeço ao belo comentário na qual você a expõe. Sobre a questão da água, é um ponto interessante para se olhar.

    Bruno: De acordo. Aliás, eu entendo que a pretensão brasileira de ser membro permanente do Conselho de Segurança trata-se de um equívoco - dos raros em uma política externa que, historicamente, é mais bem realizada que a nossa política interna.

    Guilherme: Eu concordo contigo em linhas gerais, é evidente que se trata de um modo errado de intervir contra Kadafi - sobretudo pelas segundas intenções disso -, mas não é uma situação tão fácil; de fato, ele estava matando as pessoas mesmo, o que fez a vaca ir para o brejo porque ele se tornou um álibi real para isso.

    abraços

    ResponderExcluir
  17. Péssimas notícias, Hugo - a revolução já foi 'enquadrada' pelas potências ocidentais, segundo o Pepe Escobar para o Asia Times online (em inglês):

    http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MC30Ak01.html
    http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MC31Ak02.html

    ResponderExcluir
  18. Você tocou na palavra ~ paranoia ~ para definir um traço marcante de Kadafi( e do poder tirânico, naturalmente). Disse uma vez Canetti que " A paranóia é uma doença do poder". De fato, tanto os paranóicos hospitalares quanto os dirigentes autoritários têm uma patoplastia "política": perseguir, ser perseguido, ficar " pra semente", identificar-se com forças divinais, etc, etc. Kadafi tem esse percurso, e chegou a fazer história nesse sentido, desde a sua alvorada heroica, passando pela fase experimental de mixagem entre valores religiosos e políticos( no caso, a louca tentativa de unir marxismo com fé),o capítulo terrorista, o capítulo do escritor, narrando histórias para um público infanto-juvenil e, finalmente, a noturna cristalização tirânica.Nesse percurso,o nomandismo de Kadafi não se tornou apenas territorial, mas especialmente ideológico, através, no entanto, de uma ideologia que nunca conseguiu se consolidar, afeiçoando-se mais a uma colcha de retalhos manchada de todos os ressentimentos possíveis.

    ResponderExcluir