O Incêndio/ Agência Estado |
E não falamos de uma favela qualquer: ela era uma das poucas concentrações habitacionais de pobres dentro do núcleo urbano de São Paulo, uma cidade na qual o funcionamento do poder foi hábil em segregar essa população em uma longínqua periferia - ou mesmo, deixa-la difusa nas ruas. O Moinho, aliás, era um pólo histórico de resistência urbana, na qual os moradores lutavam contra uma particularmente incessante violência policial e o arbítrio de um (des)governo municipal, alinhado, de forma plena e cordial, com a especulação imobiliária - além de ser espaço de disputa relevantíssimo onde movimentos sociais e organizações humanitárias confrontavam essa lógica urbana absurda. Será que agora, seus desamparados moradores, conhecerão a "presença do Estado" em um sentido que não a violência policial constante?
Em meio a esse pedante enredo de final de ano paulistano, a mesmice das milhões gastos com uma decoração natalina pífia que remente a invernos que desconhecemos, esse incêndio acende de vez um debate que está dormente: São Paulo morre lentamente, vítima de uma crise (bio)política cujos sintomas são uma poluição insuportável, a falta da mobilidade urbana, e de tragicomédia de sua administração atual, encabeçada por Gilberto Kassab - sendo que a Prefeitura, hoje, não passa de um leviatã manco ocupado por boçais, que fazem um desgoverno no sentido em que dizemos que um carro está desgovernado.
O desafio posto, para além do aspecto eleitoral que se anuncia para o ano que vem, é enormíssimo. Não é o caso de vir aqui com a platitude de que precisamos de um bom governo: precisa-se na capital paulista da produção de um anti-governo, pois é preciso desmontar o esquema de poder como ele está posto, desfazendo a forma Estado, ao passo em que se constrói organismos garantidores da autonomia das comunidades na organização dos espaços - para fazê-las funcionar, a partir daí, a despeito de qualquer gestão de Prefeitura, coisa que a gestão Erundina, ao menos, se dignou a sonhar.
O grande entrave para isso, hoje, é o esquema sombrio e invisível da especulação imobiliária, que faz alugueis e valores de imóveis crescerem absurdamente na Pauliceia. Não é o caso de pensarmos em abstrações, mas sim na concretude da metrópole, seus modos de produção, reprodução e autoprodução. Isso requer uma luta e uma articulação profundamente complexas.
na cobertura da globo news do incêndio, toda e longa ao vivo... o titulo era incêndio destrói prédio abandonado no centro de são paulo... nenhuma palavra sobre a favela.... embora fosse visível q o fogo se espalhava muito além do prédio foco do noticiário... Só soube que trezentos (?) barracos haviam queimado lendo hj a FSP... globonews dizia q o prédio era invasão de catadores de lixo... e mostrava bombeiros resgatando 11 pessoas do teto do prédio... nenhuma vavela à vista...
ResponderExcluirQualquer semelhança com as Diretas Já! não é mera coincidência.
ResponderExcluirPois é, mas nem o prédio era abandonado, cerca de 200 famílias viviam ali, e muitos não conseguiram sair do prédio e suas mortes viraram silêncio, pq não permitem que ninguém documente nem divulgue nada.
ResponderExcluirLu, o que os moradores sustentavam, até a manhã do dia 24, era de dois mortos. Parece-me que se confirmou mais uma. Até bem pouco, havia 30 pessoas com destino não determinado - que podem ser desaparecidos ou não -, mas até agora a Prefeitura não se manifestou com clareza. É possível, até pela dificuldade em identificar as pessoas, que o número de mortos seja maior, sobretudo no velho prédio (que constituía um dos blocos da comunidade) onde começou o incêndio.
ResponderExcluirbjo