quinta-feira, 16 de julho de 2009

Sobre Debates e a Blogosfera

Ontem, como anunciei aqui, participei de um belo debate no Consenso, Só no Paredão, o magnífico blog do nosso amigo Alexandre Nodari. Apareceram por lá o Idelber, o Maurício Caleiro, a Flávia Cera, o João Villaverde e mais um pessoalzinho bom de papo. Debatíamos o Extinção, livro do filósofo Paulo Arantes, figura polêmica, verborrágica e por vezes visceral. Pode-se reclamar de muita coisa do Arantes, mas não que ele não suscite o debate, seja pela pontas soltas que ele deixa na sua narrativa panorâmica ou pela forma como ele se posiciona politicamente.

Sobre os detalhes do que discutimos sobre o livro, basta dar uma passadinha por lá e ler os mais de cinquenta comentários até este momento. O foco aqui, na verdade, é pontuar a importância da blogosfera e lembrar como é possível fazer coisas interessantes nela - e como só vale a pena fazê-las se for desse modo. Há quem sustente o argumento de que a blogosfera está condenada a simplesmente reproduzir as informações que a mídia corporativa produz, apenas passando um verniz político-partidário, não raro, sectário, nisso daí. Ledo engano. Os blogs, acidentalmente ou não, acabaram se tornando um espaço onde é possível se realizar o debate político e intelectual como nunca houve na história brasileira - seja por uma necessidade de experimentar o debate democrático, o que raramente se concretizou no mundo real - seja lá o que isso for - ou pela necessidade de se posicionar em relação ao que a mídia corporativa produz informações, indo muito além do que o Oligopólio que controla o setor de difusão da informação no país faz.

O lance é justamente esse: O cidadão tem a possibilidade de sair da passividade a qual foi condenado e se torna agente ativo - mais do que isso, interativo - podendo questionar a informação que recebe ou complementa-la. Para além do debate político, é possível construir o debate artístico e esportivo assim como dividir experiências e trazer informações novas que antes precisavam do intermédio do meio de comunicação oficial - o que acaba sendo auxiliado de maneira inacreditável hoje pelo twitter, que passa ao largo de ser um espaço de reflexão, mas permite a troca de informações numa velocidade inacreditável entre meros mortais, antes, no máximo, meras fontes.

Aí voltamos ao debate no Consenso: A blogosfera cria a possibilidade de se fazer um debate de alto nível que seria muito difícil de ser realizado fisicamente e marca um avanço no debate intelectual, antes enclausurado na Academia - e talvez por isso, cada vez mais anêmico dentro dela própria. Cria-se uma solidariedade informacional por meio da ruptura da antiga fragmentariedade, o que possibilita o avanço do pensamento crítico - na contramão do que o próprio Arantes pensa e como o debate sobre próprio livro prova o contrário.

Obviamente, há desafios muito grandes. Um deles, a inclusão digital no nosso país, também - e não menos importante - o debate sobre a própria gestão da Rede em nível global assim como a luta, em caráter local, contra projetos de lei como os do Senador Azeredo que trazem de maneira explícita uma faceta policialesca e tosca, mas não há como negar os avanços.

7 comentários:

  1. Bom texto, Hugo. Análise muito boa da blogosfera.
    Um abraço

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  2. Hugo: de fato a Internet não só amplia a esfera pública. Ela a transforma. Talvez em nenhum outro "espaço", haja tamanha possibilidade de construção coletiva - e o pensamento é sempre comum, aberto a todos. Uma pergunta que me tem passado pela cabeça é se Habermas, o teórico da esfera pública, se debruçou sobre a internet. Pelas informações que recebi - ainda teria que fazer uma varredura dos livros, ele só menciona a possibilidade de ampliar a esfera pública tradicional (dependente da imprensa e das mídias mais "antigas"), através da virtualidade. Mas a internet não é só isso. Não é o antigo ampliado. Evidente que há mediações (o teclado, a tela, os processadores, os provedores, etc.), mas não necessariamente a mediação de um órgão permanente (a imprensa). Na blogosfera, por exemplo, os mediadores se confundem com os debatedores, autores e públicos se indiferenciam. Os novos bárbaros chegamos para ficar.

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  3. É isso aí, Hugo.

    O papo de ontem lá no “Consenso, só no paredão” provou que na internet pode ocorrer um debate qualificado e que os blogs não estão fadados a ser meros canais de repercussão do que é publicado na imprensa tradicional... Onde mais, que não num ambiente tão democrático quanto a internet, poderia acontecer um debate daquele nível? Na imprensa? Óbvio que não. Na academia talvez, mas, como você disse, ele está cada vez mais anêmico, sem vigor, elitizado.

    Eu sou um entusiasta da internet, talvez até um pouco exagerado nesse entusiasmo, mas veja só o meu caso. Eu estou fora da academia há cinco anos, desde que me formei, e trabalho em uma área que não tem nada a ver com o que discutimos ontem. Um cara como eu, na era pré-internet, estaria fadado a ficar excluído dessas discussões. A internet veio para colocar todo mundo na roda...

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  4. Alexandre,

    Eu tenho um conhecimento incipiente da obra de Habermas, mas seria interessante saber qual é a visão que ele tem sobre o fenômeno internético - e, mais precisamente, sobre o fenômeno blogosférico. A Internet é isso daí mesmo, cá a mediação é objetiva e não subjetiva; em outras palavras, ela é formal e não material; o meio são os objetos, os mecanismos que nos unem apesar de estarmos bem distantes fisicamente uns dos outros, no entanto, materialmente falando, a diferença do meu blog para algum outro é apenas que aqui eu dou início a conversa, mas os autores são necessariamente todos aqueles que comentaram em seguida. É exatamente isso: Uma Construção Coletiva.

    Bruno,

    Em outros países, o fenômeno blogosférico não tem nem a metade da significação que ele tem no Brasil porque, bem ou mal, já existiam espaços públicos para o debate intelectual e político. Aqui não. Apesar de não sermos necessariamente o mais desgraçado país do mundo, o Brasil não construiu um espaço na mídia tradicional ou na Academia - ou na Praça Pública, que seja -, onde as pessoas pudessem debater ideias. Mesmo na Academia, frequentada por tão poucos entre nós, o debate é cada vez mais rarefeito. Eu, por exemplo, estaria limitado ao mundinho da Faculdade o que, apesar de ser uma situação privilegiada em relação à média nacional, ainda me deixaria num espaço bem restrito - seja pela endogenia da universidade brasileira ou pela decadência do debate intelectual mesmo nos meios acadêmicos.

    abraços coletivos ;-)

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  5. Hugo,

    Excelente post, demonstra por "a + b" que a internet é - e pode vir a ser mais ainda - um ambiente de avanço do debate intelectual e democrático.

    Como o amigo sabe, sou um crítico do otimismo exacerbado e autoindulgente na blogosfera, dessa história de achar que esta está em vias de "derrotar a mídia". Acho isso de uma ingenuidade intelectual atroz, e enquanto um blog não atingir pelo menos a metade da audiência do Jornal Nacional esta será minha posição (atenção: estou sendo irõnico!).

    Continuo achando também que os blogueiros, muitas vezes, atuam como reprodutores ou críticos de informações produzidas pela "grande mídia" e que para se reverter isso de modo sistemático - o que, é claro, considero desejável - seria necessária alguma forma de articulação entre blogueiros e de preenchimento das demandas de capital necessárias à execução periodicizada e ininterrupta de pautas, bem como o aprimoramento e a expansão destas.

    Isso posto, é evidente que as possibilidades da internet são imensas para o exercício da crítica autêntica e da circulação de informações. O debate, que você tão bem descreve, foi um exemplo disso não apenas primoroso, mas inspirador.

    A comparação que você fez, da dinâmica do debate na internet com o engessamento entremuros dos debates acadêmicos, é irretocável. Sem deixar de lamentar que assim seja (pois os dois ambientes poderiam ser dinâmicos e se enriquecerem mutuamente), concordo em gênero, número e grau.

    A tempo: achei perfeita a sua descrição do Arantes ("figura polêmica, verborrágica e por vezes visceral"). Não lembro de você ter se utilizado exatamente desses adjetivos nas suas excelentes intervenções no debate, mas elas correspondem fielmente ao personagem.

    Um abraço,
    Maurício.

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  6. Maurício,

    Sim, sim, por isso eu enfatizei - em parte em virtude do nosso debate anterior sobre o tema - que a Blogosfera traz a possibilidade dessa ordem ser subvertida, portanto, que ela não acontece sempre, mas que também o meio não está condenado ao mero reprodutismo como seus opositores colocam - no que você há de concordar comigo.

    Sobre a questão de Blogosfera e remuneração, eu tenho minhas dúvidas, em muitos momentos eu acho que a grande hype dela é essa desmercantilização da notícia, em outros, eu reflito a respeito de formas de remuneração que não atrapalhassem o modo da Blogosfera funcionar e que servisse de incentivo aos blogueiros, mas até hoje não vi exemplo bem-sucedidos. Você poderia avançar mais no debate sobre esse tópico?

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