O Brasil pós-88 caminha, no entanto, para a direção dos demais Estados Legais do mundo, com a aplicação do direito positivo de uma maneira cada vez mais igualitária - mas não equitativa, o seria uma contradição à sua essência; o acesso à defesa ainda é retrito e quase inacessível para a maior parte da população. O fato é que punições para dirigentes estatais e membros da classe dominante se tornaram não só possíveis como se concretizaram. O sentimento popular de revolta com a impunidade é dirimido lentamente - a punição penal dos poderosos dá a sensação de que a "justiça está sendo feita".
Em casos como o de Daniel Dantas em 2008, onde ele, um figurão tanto das finanças quanto das telecomunicações acabou preso ao tentar subornar policiais federais que o investigavam por sua forma nem um pouco sutil de atuar num jogo que passava pela disputa do controle de grandes capitais telecomunicacionais entrelaçados com assuntos de Estado. O ponto fundamental é: A legitimidade aparente - e consequentemente a eficácia social - do direito penal passa pelo crivo de que a Justiça Penal não pode punir seletivamente as pessoas - protegendo, especialmente, aquelas que ocupam posições proeminentes no sistema - ao mesmo tempo em que ela serve para a manutenção da ordem necessária para o funcionamento de um sistema cujo funcionamento resulta, necessariamente, em uma profunda desigualdade entre os indivíduos que fazem partem dela.
Há dois atritos fundamentais aí - como já assinalava nos anos 50 Orlando Gomes, um dos maiores juristas brasileiros da história, em seu ensaio Marx e Kelsen: A primeira seria o antagonismo entre conceitos jurídicos contidos dentro do próprio ordenamento, ou muitas vezes dentro da mesma Consituição, quando é legitimada tanto a função social da propriedade quanto a livre iniciativa privada - a mesma carta que promove um elogio ao coletivo e medidas para dirimir contradições reais existente é aquela que legitima jurdicamente elementos que permitem que eles continuem sendo produzidas; a segunda a existência de uma ordem política arcaica em meio ao corpo social que se choca com a figura antitética de um novo projeto político a ser aplicado e que, por sua vez, é materializado na forma de uma Constituição - como vimos na Europa do pós-Guerra e no Brasil pós-Ditadura.
No caso de José Roberto Arruda, único governador do direitista DEM, as investigações sobre esquemas de corrupção envolvendo sua participação resultou numa quantidade razoavelmente grande de provas, dentre elas até mesmo vídeos bem claros - como relatado por aqui em dezembro. Agora, o STJ decretou a prisão preventiva do governador por ameaça a ordem pública, fundamentado no fato de que Arruda passou os últimos meses tentando corromper testemunhas e, portanto, sua liberdade ameaçou o andamento das investigações - como ficou patente pela inércia da Câmara Legislativa em abrir processo Impeachment contra o governador. Desde a redemocratização é a primeira vez que um governador é preso e, mais do que isso, é uma das raras - senão única vez - que um governador é preso por conta das regras postas e não por motivos políticos em um estado de exceção legal, o que suscita a manisfestação de um novo fenômeno.
Há dois atritos fundamentais aí - como já assinalava nos anos 50 Orlando Gomes, um dos maiores juristas brasileiros da história, em seu ensaio Marx e Kelsen: A primeira seria o antagonismo entre conceitos jurídicos contidos dentro do próprio ordenamento, ou muitas vezes dentro da mesma Consituição, quando é legitimada tanto a função social da propriedade quanto a livre iniciativa privada - a mesma carta que promove um elogio ao coletivo e medidas para dirimir contradições reais existente é aquela que legitima jurdicamente elementos que permitem que eles continuem sendo produzidas; a segunda a existência de uma ordem política arcaica em meio ao corpo social que se choca com a figura antitética de um novo projeto político a ser aplicado e que, por sua vez, é materializado na forma de uma Constituição - como vimos na Europa do pós-Guerra e no Brasil pós-Ditadura.
No caso de José Roberto Arruda, único governador do direitista DEM, as investigações sobre esquemas de corrupção envolvendo sua participação resultou numa quantidade razoavelmente grande de provas, dentre elas até mesmo vídeos bem claros - como relatado por aqui em dezembro. Agora, o STJ decretou a prisão preventiva do governador por ameaça a ordem pública, fundamentado no fato de que Arruda passou os últimos meses tentando corromper testemunhas e, portanto, sua liberdade ameaçou o andamento das investigações - como ficou patente pela inércia da Câmara Legislativa em abrir processo Impeachment contra o governador. Desde a redemocratização é a primeira vez que um governador é preso e, mais do que isso, é uma das raras - senão única vez - que um governador é preso por conta das regras postas e não por motivos políticos em um estado de exceção legal, o que suscita a manisfestação de um novo fenômeno.
O enfoque dado na cobertura midiática, no entanto, é o da satisfação/temor por conta da concretização da Lei e do caminho para o "fim da impunidade" - ou mesmo das consequências políticas do fato, um abalo muito forte na maior agremiação partidária de direita brasileira, peça fundamental no jogo hegemonista de Serra - seja pela proximidade de Serra com Arruda ou por quanto isso é negativo para o DEM, partido irmão do PSDB, o que pode ser fatal para a candidatura tucana na medida em que o PT articula aliança com o PMDB. A questão, claro, é mais complexa do que isso.
Em outras palavras, o Capitalismo se despersonaliza a cada dia mais e aplicação seletiva da Lei deixa de ser necessária: O seu funcionamento, agora num estágio pós-industrial, depende de um sistema de punição para garantir a estabilidade do sistema econômico, neutralizando até mesmo seus dirigentes na medida em que seu movimento se autonomizou da figura da persona pública; é a expressão da síntese que se operou entre o projeto constitucional da 88 e a realidade política nacional herdada pelo regime e mesmo dos antagonismos dentro da ordem jurídica atual: O fundamento para a prisão de Arruda está no mesmo sistema que permite que espécies como ele surjam - a menos que a existência de personas políticas como Arruda sejam fruto de uma maldade congênita ou pior, de um fenômeno isolado.
Não, o que aconteceu seja com Dantas ou com Arruda está de acordo com lógica ideal do direito posto, mas isso vai muito para além de punição dos maus - como também não é, de modo algum, um atentado às liberdades individuais e a afirmação de um Estado policialesco -, mas sim o avanço do Brasil para se tornar um Estado Legal tal e qual as nações civilizadas contemporâneas, o que por si só não quer dizer muito no que toca à resolução das contradições reais que ameaçam a existência da humanidade.
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