domingo, 22 de janeiro de 2012

Em Defesa do Pinheirinho

A Resistência no Pinheirinho


Desde o final do ano passado, após o incêndio da Favela do Moinho em São Paulo, um assunto recorrente passou a ocupar este blog: a problemática da habitação - sobretudo neste estado de São Paulo -, fenômeno marcado pela articulação entre o Poder Público, a especulação imobiliária e a polícia. O mesmo volta a se repetir agora na favela do Pinheirinho, em São José dos Campos.

Com efeito, essa insistência temática não se deu à toa: um corte relevante realmente ocorreu. É um processo global que está, inclusive, na cerne da presente crise econômica, mas em São Paulo, último bastião realmente relevante do conservadorismo brasileiro, isso toma uma dinâmica perigosa. 

A bola da vez é a desocupação em curso - e completamente ilegal - da Favela do Pinheirinho, em São José dos Campos, o mais emblemático caso do atual ciclo: aquela comunidade, com seus milhares de habitantes, foi erigida em terreno pertencente à massa falida de uma empresa pertencente a Naji Nahas, um mega-especulador cujas pegadas podem ser vistas até mesmo na quebra da Boverj entre outros golpes - e desde então existe um conflito judicial se estende, chegando à culminância nas últimas semanas. 

O fato é que a Justiça Federal determinou a suspensão do processo de reintegração de posse do terreno, enquanto a União tem se mobilizado para adquiri-lo, mas uma sentença da Justiça Estadual a contradisse criando um conflito de competência - que deveria ser dirimido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

Eis que antes de qualquer decisão do STJ, foi desfechada a presente operação policial de desocupação do terreno, inciada nesta manhã de domingo, o que se constitui em tamanha ilegalidade que valeu inúmeros pronunciamentos do Presidente da OAB nacional, Ophir Cavalcante Jr.

Retomando o que já é dito por aqui, favela não é campo de concentração - ele é não zona de segregação -, nem alternativa de moradia, mas sim linha de fuga de um destino certo: a morte ao relento. É locus definitivo de resistência ao deixar morrer ao relento, ao qual estão condenados 22 milhões de brasileiros aproximadamente (mais de 10% da nossa população)!

O Pinheirinho é uma experiência de resistência desse tipo particularmente interessante: o modo como seus moradores se organizaram para resistir, travestidos como policiais é de uma antropofagia tão maravilhosa quanto espontânea.


Nada disso, no entanto, seria suficiente para impedir a entrada de força policial lá. Triste retrato de uma Constituição rasgada, na qual a dita função social da propriedade e a dignidade da pessoa humana jazem diante de uma jurisprudência que põe o patrimônio sobre a vida humana - e dessa vez, nem isso, pois a polícia não tinha autorização judicial para ter agido nessa circunstância.


Alckmin está disposto a ir até o final, sem concessões e sem parar. Os próximos anos tendem a uma intensificação de confrontos desse tipo - que podem acontecer de forma mais ou menos legitimada, mas dessa vez não houve sequer esforço nesse sentido, o que só aumenta a minha preocupação com a hipertrofia policial paulista.


É uma situação de uma gravidade sem tamanho. Diante da querela entre a massa falida de Nahi Najas e o direito a um teto para milhares de famílias não existe possibilidade de omissão.

12 comentários:

  1. O Secretário Geral da Presidência (status de Ministro) considerou que a reintegração de posse violenta do Pinheirinho foi precipitada e disse que estranhou o fato do Prefeito Municipal de São José dos Campos, Eduardo Cury, ter cancelado uma reunião na quinta-feira. A reunião seria para tratar desse assunto. O Secretário Geral, segundo noticiado, telefonara para o Governador do Estado, Geraldo Alckmin..

    Pelo visto, no Estado Brasileiro as esferas Federal, Estadual e Municipal vivem em universos diferentes... Não conseguem se comunicar, ou, o que é muito pior, uma não considera o que a outra tem a dizer sobre coisa alguma...

    Situações como essa fazem o País --- tão cantado e decantado por sua pujança econômica --- desnudar-se diante das demais nações como um típico representante do 3º Mundo...

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    1. O governo Federal tomou um passa moleque de Alckmin. A questão é: ele vai ficar calado ou vai retaliar pesado contra esse abuso hediondo?

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  2. Vai ficar calado, Hugo. Vai ficar calado porque a omissão é para esse governo, para essa presidente, um modo de existir. Essa cultura miserável do não-enfrentamento para nutrir uma governabilidade impossível, infame e, em tantos, tantos aspectos, simplesmente criminosa. Vai ficar calado porque valoriza mais o conforto da sua posição do que a luta contra o fascismo e a barbárie. É de chorar de raiva.

    Cajueiro

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    1. O governo até esperneia - o Gilberto Carvalho, como o Marco colocou aí em cima, se pronunciou, mas para mim isso é o mesmo que ficar calado. Resmungo aqui é silêncio mesmo. A voz do governo federal tem poder, desde que não seja bravata. Isso vai passar barato mesmo? Chorar de raiva eu não vou, é questão de juntar as forças e sair às ruas. Muita gente do PT, inclusive autoridades, já saíram, agora o Palácio do Planalto foi desautorizado e vai ficar pianinho? A quem isso interessa?

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  3. EM defesa dos Direitos Humanos do cidadão brasileiros e paulista creio que é pertinente pedido de CASSAÇÃO DO GOVERNADOR GENOCIDA GERALDO ALCKMIN. Da mesma forma quea foto dos soldados americanos urinando sobre corpos afegãos circulou o mundo e provocou indignação, as fotos da ação da PM deveriam ser enviadas até a ONU para que essa se pronunciasse sobre a bárbara ciolação de Direitos Humanos cometida pelo governo Alckmin. CASSAÇÃO JÁ AO GOVERNADOR HOMICIDA.

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    1. Agora tem de ser pressão até o fim. O (des)governo Alckmin merece a mesma trégua que reserva às minorias.

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  4. Hugo,
    Acabei de ler no site do STJ:
    http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=104494

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    1. Fernanda, sim, mas a polícia só poderia agir, formalmente, uma vez resolvido o conflito de competência - o que aconteceu apenas depois da invasão. Em outras palavras, naquele momento sequer havia ordem alguma - e mesmo que houvesse, seu cumprimento deveria atender requisitos de proporcionalidade. Nada disso aconteceu.

      abraços

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    2. Hugo,

      Pois é...também pensei nisso. O que me chamou a atenção foi a rapidez com que foi dado um aspecto de legalidade, de modo a justificar a brutalidade cometida e encerrar toda a repercussão /protesto.
      terrível. tô chocada.

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    3. Mas o "aspecto de legalidade" - ou melhor, a aura de legitimidade - é (quase) tudo nesse jogo, Fernanda. E somos dois chocados.

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  5. Hugo, vídeos e fotos do MAssacre, eu estive lá no domingo... http://www.tsavkko.com.br/2012/01/massacre-do-pinheirinhos-fotos-e-videos.html

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    1. Infelizmente não pude ir lá por conta de uns problemas que eu tive, mas estamos a postos, Raphael - e valeu pelo link.

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