(protestos em Londres - Luke MacGregor/reuters, retirado do Guardian)
Pois bem, o principal tema no noticiário internacional até ontem era a questão do programa nuclear iraniano, o que passava pelo acordo trilateral que o Brasil junto com a Turquia travaram com aquele país. Em cima disso, os debates, análises e conjecturas sobre os problemas do Irã e o que se esconderia (ou não) sob o véu de seu Programa Nuclear eram abundantes e soltavam faíscas - e o blog trouxe algumas análises sobre o assunto.
Quando ainda tentava racionalizar o impacto, me deparo, hoje, com a notícia do que Israel fez com os navios que levavam ajuda humanitária para Gaza: Depois de passar alguns dias tentando bloquear seu, avanço, acabaram atacando a pequena frota, matando, até as informações que eu tenho agora, dezenove ativistas e prendendo mais de oitenta. É inacreditável a ação. Ela é totalmente desproporcional, fora de qualquer norma de direito internacional e, sobretudo, de uma desumanidade ímpar.
Não creio que seja fora de contexto debater a questão da opressão histórica contra os judeus pela História ou, especialmente, a política genocida em massa engendrada pelos ideólogos da eugenia das sociedades industriais europeias já do século 19º quando se fala de Israel, o problema é como isso entra na conversa: O meu ponto é que, odiosamente, isso tem servido de álibi para setores de interesse específico de Israel e do Ocidente - que usa aquele Estado como uma espécie de proxy no Oriente Médio -justificarem toda sorte de políticas, portanto, isso nada tem a ver com judaísmo, proteção dos judeus ou com tudo que os judeus já sofreram. Simples assim.
Comparações entre o regime nazista e o modus operandi dos dirigentes israelenses são um tanto descabidas, ao meu ver. A conjuntura histórica é diferente, não há nazismo em Israel e, ao fazê-la, bate-se por bater, usando um ponto particularmente - e justamente - doloroso para os judeus de todo o mundo - pró e contra as políticas de Israel -, o que ao mesmo tempo que é cruel, também ajuda a alimentar a ideologia que a classe dominante local usa para justificar sua megalomania e incompetência. A grande questão aqui é a questão do Estado de Exceção, fenômeno recorrente nos Estados de inspiração greco-romana e cujas raízes, suspeito, são o calcanhar de aquiles dessa forma de organizar politicamente, seja há dois mil atrás ou nos dias de hoje, talvez uma falha intrínseca ao modelo, talvez algo mais profundo, de fundo antropológico, não sei dizer.
Israel tornou-se um Estado bélico no qual a regra é afastada à exaustão internamente de tal forma que passou a ser afastada no plano externo também, provocando um esgarçamento não apenas da sua legitimidade enquanto Estado - aqui no plano formal - quanto na reiteração de decisões cada vez mais irracionais - e perigosas, no plano material. No atual momento, tomar uma atitude como a de matar ativistas que levavam ajuda humanitária aos palestinos e estavam desarmados é, sobretudo, um sinal de loucura.
Além da tragédia em si, ela enfraquece Israel perante a comunidade internacional e fortalece a posição do Irã por contraste. Em suma, Israel não ganhou nada com isso, nem mesmo aqueles dirigentes aos quais eu me referia, muito menos seu povo, o que é uma ilustração dessa insanidade - por fim, uma expressão da contradição do Estado de Exceção estourando. Há quem diga que isso caiu como uma luva para, no momento atual, bloquear a escalada contra o Irã, trata-se de um ledo engano, esse é apenas mais um fio desencapado do Oriente Mèdio - o maior e mais perigoso deles, é verdade - soltando faíscas e se mostrando fora de controle. Isso é um problema para o Irã, para seus vizinhos e para toda comunidade internacional. No duro, em que pesem todos os riscos que o regime dos aiatolás represente para o mundo - ele representa -, nada se compara à Israel atualmente e se ele não for neutralizado pela comunidade internacional, provocará, cedo ou tarde, um desastre incontrolável.