terça-feira, 30 de março de 2010

Reflexões sobre a Política em Tempos Pré-Apocalípticos

Enquanto a Rússia permanece em crise com a implosão do seu sistema político - o que se manifesta pela uso sistemático do terrorismo como instrumento de diálogo pelos mais variados setores (em que pese a inexistência de simetria entre as partes, pois uma delas é o Estado), ou seja, a violência enquanto linguagem -, cá no Brasil, São Paulo segue dias funestos depois da repressão à greve dos professores: O governador alega que a greve em questão foi "política" e, agora, seu partido, o PSDB, pretende entrar com uma representação contra a Apeoesp (Associação dos Professores do Estado de São Paulo) no TSE alegando "contrapropaganda eleitoral". 

Resta saber qual greve não é política, mas o governador, douto acadêmico e ex-militante da UNE, usa-se do ódio à Política - insuflado nos corações e mentes dos cidadãos durante décadas pelos nossos regimes autoritários - para, assim, lançar mão da medida mais manjada, dentre as medidas manjadas de governos autoritários frente a movimentos de reivindicação trabalhistas: A deslegitimação da figura do oprimido, ora organizado e reivindicante, por meio de uma espécie de ad hominen em massa.

A representação do PSDB no TSE, diga-se de passagem, seria trágica, se não fosse cômica - e esse pobre escrivinhador que vos escrivinha confessa que, após horas tentando descobrir se isso é fruto de má intenção pura ou de esquizofrenia, chegou a conclusão que tomara que seja má intenção, porque se alguém realmente acreditar nisso, é a deixa para se fugir para o Paraguai: A singela tese de contrapropraganda eleitoral é assaz curiosa e não deixa de entreter mentes desocupadas como a minha - se estamos todos vedados de falar mal do PSDB em público, só porque é ano eleitoral, não seria isso sim uma "contrapropaganda", ou melhor, uma propaganda do silêncio - igual o da Revolução Silenciosa que Serra promove na Educação Pública -? Preso por ter cachorro e preso por não ter cachorro? Se a manifestação é inválida porque o ano é eleitoral, em que pese quatorze anos sem aumento salarial real da categoria, deveriam então os professores se reservarem a fazer manifestações apenas em anos ímpares?

Se a Política continua viva na atuação dos professores em greve, da parte do governo do estado, ela só existe em um sentido perverso, perfeitamente possível e recorrente ao longo da História: Na sua autodestruição. Isso mesmo, a Política é uma esfera da convivência humana que não se realiza por si mesma - em que pese ser imprescindível - no máximo, servindo para traçar nortes; de modo direto mesmo, ela serve para se autosustentar; de modo prático, a única intervenção possível dela na realidade é por meio de sua autodestruição, pois aí acabam-se os nortes e sobram apenas os norteadores - como na Rússia, onde todos os lados possíveis estão matando e se matando por conta de um estado de coisas decorrentes aos mesmos anseios que motiveram a Revolução Russa: Liberdade civil e política, Igualdade Social e Igualdade entre as várias etnias; enfim, o trinômio que lá conseguiu engolir a Revolução com o maior potencial emancipatório já ocorrida na história humana.

Ao contrário do postulado de Von Clausewitz, a Guerra não é a continuação da Política por outros meios, mas uma inerência de sua implosão - e esse pensamento é a definição mais sintética, e profunda, do gigantesco equívoco que mergulhou a Europa, décadas mais tarde, em sangue e que ronda o mundo contemporâneo de forma insistente, quem sabe tentando nos vencer pelo cansaço, o que seria das melhores táticas para uma estratégia intrinsecamente suicida.

5 comentários:

  1. Retorno a questão : porquê não UNE?:

    Em continuidade a entrevista da professora no
    http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/jessie-jane-%E2%80%9Ca-raiz-da-corrupcao-e-da-violencia-que-estao-ai-e-o-golpe-militar-de-1964%E2%80%9D.html

    segue outra constatação em

    http://www.noticiasdacorte.blogspot.com/


    terça-feira, 16 de março de 2010
    Sobre a irrelevância dos líderes estudantis
    Quem passou pelos corredores de uma Universidade Federal, no caso a UFRGS, conhece muito bem os líderes estudantis que comandam centros acadêmicos e diretórios. Em geral, nos anos 90 e 2000, foram representantes de partidos localizados no espectro esquerdista do mundo político, PT, PC do B, PSTU e, mais recentemente, PSOL. A ascensão do PT ao poder e a renúncia do partido ao seu ideário histórico abriu generoso espaço para as siglas menores. Nunca testemunhei eleição para diretório da Universidade com significativa participação. Retrato perfeito da descrença e do prestígio perdido pela política. No comando desses órgãos, os ‘estudantes-militantes’ serviam aos interesses de seus partidos e defendiam causas amplas, normalmente ligadas à realidade do país e à conjuntura internacional. Raros enveredaram pelo mundo político do voto, muitos habitam o universo dos assessores remunerados. Tal constatação nos faz pensar na diferença entre um projeto coletivo, a participação em uma entidade de representação estudantil, e um projeto estritamente pessoal, alavancar espaços por meio desse instrumento. Tais constatações servem apenas para preambular o fato de que tenho levado sustos ao ler manifestações dos líderes atuais do DCE da Ufrgs. O jogo inverteu-se. Agora são todos representantes de partidos localizados no espectro direito – PP e PMDB anunciaram os jornais quando do pleito. Ganharam uma eleição legítima, apesar da escassa margem e da participação minoritária dos estudantes. Na verdade, dizendo com clareza, exceto meia dúzia, ninguém está preocupado com o que ocorre no mundo do DCE. Por isso, talvez, ele tenha se transformado no palco em que neófitos integrantes de partidos políticos buscam angariar legitimidade para ocupar cargos depois. Nada contra. Esta é apenas uma constatação. Mas os discursos dos atuais dirigentes do DCE assustam, são exagerados, pueris, totalitários – sem falar na sabugagem da visita a empresários como Jorge Gerdau. Da mesma forma como os líderes do passado recente dialogavam com um socialismo ultrapassado, os atuais expressam um certo fascismo. O termo pode ser forte, mas os textos que até hoje li revelam um namoro intenso com o radicalismo de direita, com um obscurantismo do qual deveríamos desejar distância. A ascensão dessas mediocridades intelectuais é a prova definitiva de que o movimento estudantil não conta mais, exceto para fazer um barulho, vez ou outra. Quantos dos estudantes da Ufrgs influenciam-se pelas ideias de seus supostos líderes? Quantos participam dos processos eleitorais? Quantos querem saber das questões metafísicas que lhes são apresentadas? O processo político não é um bem em si. Se os interessados querem distância desse movimento, é o sinal que ele precisa se reinventar. Os atuais líderes dizem que nada têm a ver com partidos políticos. As paredes da Universidade sabem que isso não é verdade. Os do passado discursavam a mesma coisa. Tudo isso prova apenas a irrelevância do movimento estudantil e de seus líderes.

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  2. Anônimo,

    É uma bela provocação, sem dúvida. Mas não acho que o problema seja o Movimento Estudantil exatamente, essa concepção de atuação política - inclusive a prática de se "omitir" da ação política em um espaço do qual você é partícipe, o que é, na verdade, uma ação política bem relevante, diga-se - decorre de um problema muito maior, que expressa a consequência de nossa organização econômica e, por tabela, da nossa forma de nos organizarmos em grupo para decidir nossos rumos - evidentemente, não necessariamente o nosso funcionamento econômico nos leva a esse estado de coisa, mas, em potência, ele abre espaço para que uma espécie de cultura como floresça.

    Eu confesso que sempre atuei no Movimento Estundantil para um projeto particular: Realizar um projeto político contra-hegemônico que leve a uma mudança dessa forma de encarar o meio em que você vive, qualquer meio, seja sua vizinhança, prédio, emprego e, sim, o espaço onde você estuda. Que o cidadão - ou suas dimensões específicas, o estudante, o trabalhador, o vizinho - atuem e intervenham no seu espaço e assim, a ideia de ver o "político" como membro de uma elite, de um seleto grupo de pessoas habilitados a decidir o futuro de todos - e o inverso: de que os não iniciados que se aventurem nessa empreitadas seja considerados meros intrometidos -, isso sim o empecilho para a democracia e impulso para qualquer sorte de regime autoritário.

    No que toca ao movimento estudantil em especial, há um interesse em deslegitimar boa parte do que vem de lá, em que pesem todos os seus defeitos, e isso tem a ver com política exercida pela burocracia que controla a maioria das universidades: Afastam estudantes e funcionáris de qualquer parte da esfera decisória como se eles fossem detentores do direito divino de comandar a vida acadêmica - porque seriam neutros, não teriam interesses alguns por detrás etc. Esse é um dos resquícios mais profundos da ditadura no Brasil: Como as universidades acabaram sendo submetidas a uma lógica burocrática que cerceia a criatividade de professores e estudantes, fazendo o jogo dos donos do poder do momento.

    um abraço

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  3. É uma pena o que constatamos. As estruturas forjadas estruturando a ação política.
    Ainda assim fica para uma desconfortável reflexão. O que pode ser feito?
    obrigado pela resposta,
    Andre

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  4. Face a sua resposta, acho interessante a entrevista

    http://muitopelocontrario.wordpress.com/2010/03/25/entrevista-com-paulo-sergio-pinheiro-quando-a-historia-e-uma-estoria/#more-3727

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  5. Andre,

    Eu creio que nunca deixar de se apropriar dos nossos espaços de convivência e refletir sobre a vida num sentido projetivo mesmo é um bom começo - como sucitei na minha primira resposta.Depois vou dar uma olhada no link.

    um abraço

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