sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O Primeiro Debate Eleitoral

Ontem à noite, a TV Bandeirantes realizou e transmitiu o primeiro debate eleitoral da atual disputa pela Presidência da República. Basicamente, foram os três primeiros candidatos nas pesquisas e Plínio de Arruda Sampaio do PSOL - partido que detém representação no Senado e na Câmara. O ponto é que o modo como esses debates são feitos - e esse não foi exceção - é muito ruim. Primeiro, todos os candidatos deveriam ter o direito de participar - pouco importa se temos doze nove, não é justo excluir ninguém que seja candidato legítimo -, depois que o próprio formato, ao contrário de privilegiar o debate de ideias, trata-se sobretudo de um espetáculo midiático. Para além da forma, o debate em si também foi bem fraco. Como debatemos aqui, existe um esvaziamento discursivo cada vez maior nas democracias contemporâneas, no Brasil, isso não é diferente - e nem por isso deva ser visto como normal. Os debates retratam bastante essa faceta - e aqui não falo de retórica necessariamente, mas de capacidade e disposição de debater.


Do debate em si, Dilma e Serra adotaram estratégias conservadoras, demonstrando sua habitual postura - são políticos muito menos retóricos e muito mais realizadores -, Marina fez o mesmo e Plínio usou de sua excepcional capacidade retórica para tentar desfazer a vantagem que os três possuem sobre ele - utilizando-se bem bem do espaço que lhe é negado por quase toda mídia corporativa. Pela perspectiva do conteúdo, Dilma, que iniciou nervosa e foi se recuperando, tinha uma vantagem sobre os demais: Números concretos para afiançar o projeto. Isso não é uma vantagem pequena da candidata petista, ainda que se aponte para o fato dela não ser uma exímia retórica-, sua força discursiva está nos momentos em que se fixa nos dados e na questão administrativa, passando a imagem de precisão e segurança - o conteúdo é simples, o que deu certo, como deu certo e o quanto. Serra, por sua vez, também não é um retórico, assim como Dilma, ele tenta passar a imagem do político gerencial e eficiente, mas se lhe falta a capacidade argumentativa, também lhe falta capacidade administrativa, o que fica claro em contraste com uma administradora que lhe é bem superior - além de ter caído na mesma encruzilhada que Alckmin em 2006, não tendo coragem de defender o Governo FHC nem de ataca-lo, mostrando um desconforto que enfraquece o próprio partido. Marina, perdeu-se ao se colocar ao centro e perdeu uma bela oportunidade de dar um cara mais coerente à sua candidatura - não gosto de candidatos que entram em eleições para pautarem certos tópicos, por mais importantes que eles sejam, como foi Cristovam Buarque em 2006 e agora a própria Marina, não resta dúvida que questões como educação e meio-ambiente são fundamentais, mas o debate não pode se limitar a eles, sob pena de banaliza-los pela exaustão que ser bandeira única de algum candidato provoca. Plínio, por sua vez, falou bem, acertou em elevar o tom - algo necessário para a situação de sua campanha, ainda que tenha exagerado nas ironias em dados momentos - e conseguiu finalmente um espaço importante para pontuar o caráter de sua candidatura, mas em termos materiais encara a limitação de pautar seu posicionamento preocupado com a perfeição de princípios e fins, mas sem a mesma sofisticação na construção de meios práticos de intervenção política para realizar as metas - porque sua candidatura foi construída para pautar o debate eleitoral mais à esquerda, diante das limitações concretas na disputa pela hegemonia, ainda assim, o resultado seria mais efetivo se considerasse as dificuldades concretas de execução da execução do programa, o que resta, portanto, é algo conceitual demais e inalcançável para a massa.


Na prática, Dilma, que está disparando nas pesquisas, saiu incólume e sua trajetória de ascensão deve persistir - o teto para tanto, até agora, ninguém conseguiu sequer prever -, o que tornou o debate improdutivo para Serra - que também não se comprometeu, mas precisava simplesmente travar sua adversária para tirar algo de produtivo na noite de ontem, mas que topou com uma Dilma se saia bem na maior parte das confrontações diretas e quando se encontrava numa situação complicada, acabava sempre se saindo com comparações entre Governo Lula sobre o de FHC, o que normalmente favorece o primeiro. Marina perdeu uma bela oportunidade de dar um caráter mais propositivo à sua candidatura, enquanto Plínio fez o contrário e voltou a disputar o terceiro lugar - e é o único candidato que alterou sua situação (para melhor, no caso), em algum grau, pelo debate de ontem, os demais cumpriram tabela e suas candidaturas seguem a mesma curva em que se encontravam antes do embate, ou seja, bom para Dilma, ruim para Serra e Marina.


Atualização de sábado 07/08: Idelber Avelar fez uma breve análise do debate no site da Fórum e André Egg também escreveu a respeito no Amalgama.

4 comentários:

  1. Sendo a mídia brasileira o que é, torna-se impensável virmos a ter algum debate diferente do que vimos na Band ontem.
    Vamos ver se a TV Brasil "ousa" organizar um debate e, se assim for,se esse debate virá a ter características diferentes das usuais. Difícil imaginar algo diferente, porque até agora essa emissora ainda não se revelou como uma verdadeira tv pública de qualidade. As entrevistas que realizou com os candidatos foram em tudo similares àquelas realizadas nas demais emissoras. Tudo é organizado de forma a impedir um verdadeiro debate de ideias.
    Mesmo assim o povo vai intuindo os melhores caminhos e já aprendeu a não confiar na mídia.
    Menos mal, não acha?
    Mariana

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  2. Mariana,

    Menos mal e, com o perdão da rima, paradoxal também. A questão da nova relação entre economia e difusão da informação, insisto, é um dos grandes temas do século que se inicia. Se por um lado as pessoas desenvolveram certo senso crítico em relação ao que é difundido - e também possuem à disposição novas mídias -, por outro lado, o poder de quem ainda tem poder da mídia está muito grande - é como se tal influência estivesse no ápice e quem a detém soubesse disso. O correto, ao meu pensar, seria a abolição da propaganda eleitoral e a realização de pelos dois debates por semana com todos os candidatos, em rede nacional com financiamento público - aí matava-se dois coelhos com uma cajadada só. Mas para tanto, é necessário políticas públicas de democratização da informação, item em relação ao qual o PT adota uma agenda conservadora e o PSDB promove retrocessos.

    abraços

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  3. Brigado pelo link.

    Mas eu acho que pra Marina o debate pode até alterar a curva. Ela vinha numa ascensão lenta e contínua, especialmente no eleitor bem informado, que me parece o público do debate.

    O mau desempenho dela pode até estagnar sua candidatura. E ela perde o que poderia ser sua grande chance: aparecer como a candidatura viável fora do lulismo, na hora que a candidatura Serra for pro buraco de vez, o que não é imporvável de acontecer.

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  4. André,

    Infelizmente, debates não têm todo esse peso no Brasil, ainda mais um debate como o de quinta que não teve nem 10% de audiência; acredito que mesmo que a participação de Marina tenha sido negativa, isso, por si só, não gerará problemas. O ponto é que sua candidatura tem um limite claro, constituído por dois fatores centrais e determinantes que, salvo um grande desastre na candidatura Serra, sempre impediram que ela viesse a ocupar a segunda posição: (I) A falta de um leque representativo de apoios, o que importa em pouco tempo de TV e pouco apoio junto aos movimentos sociais e na mídia; (II) A falta de um programa mais amplo, a questão ambiental é fundamental, mas ela não é a única, é necessário ampliar o discurso para que a própria pauta ecológica não se banalize - senão fica parecendo que sua candidatura só serve para pautar os outros candidatos em relação a essa bandeira em específico.

    Ir bem no debate - e nos debates de um modo geral - pode mudar isso um pouco para mais ou pouco para menos, mas mesmo com atuações excepcionais, o máximo que ela conseguiria é provocar um Segundo Turno - o que eu quero dizer é que a atuação formal que ela venha ter nos debates sempre será minimizada pelas limitações materiais da candidatura.

    Neste exato momento, o apoio à candidatura de Marina, tirando a presença de alguns ecologistas, coincide com a zona cinzenta onde estão aqueles que rejeitam Dilma e Serra ao mesmo tempo. Isso faz com sua candidatura também encontre um piso - muito embora Plínio tenha conseguido visibilidade para entrar na briga, creio que ela ainda assim agrega. Em suma, na hipótese da candidatura Serra implodir de verdade - não só, precisa ser um fim sangrento também -, Marina se torna a opção porque atraí os conservadores, mas isso jamais a colocaria em chances de tirar a vitória de Dilma.

    abraços

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