Ponto por ponto, ontem à noite, tivemos a apuração das eleições gerais de 2010 como todo mundo deve saber - sim, o mundo, porque creio que nunca o Brasil teve tanta importância quanto tem hoje, fato expresso pela cobertura dada pela mídia internacional ao nosso pleito; importância, senhoras e senhores, ganha nos últimos anos e pelo atual governo que ontem se deparou com o famoso copo pela metade no que toca às eleições presidenciais: Se por um lado há quem opine que ele está meio cheio, por outro lado pode-se igualmente dizer que ele está meio vazio e ambos estão errados porque ele simples está pela metade. Sim, Dilma venceu o Primeiro Turno, mas não venceu no Primeiro Turno. Por outro lado, de resto, o atual governo saiu vitorioso nas eleições para o Senado, Câmara Federal e até para os governos estaduais
No que toca às eleições presidenciais, recapitulando ao ponto que em que se encontravam as coisas na campanha, a começar por pesquisas estranhas vindas das entranhas dos mais diversos - e curiosos - institutos de pesquisa, uma curva de crescimento muito forte se consolidava dos fins do ano passado até o começo de Setembro, abalada apenas somente pela escandalização do espetáculo que uma mídia militante - velada ou não - tomou para si como profissão de fé - de ideologia e de interesse -, o que, no entanto, se consolidou apenas com uso de Marina Silva como escada na reta final - para absorver os votos que podiam cair de Dilma, mas Serra não era capaz de aproveita-los - e, sobretudo, com a boataria de fundo religioso. Sim, o PT tem um histórico ímpar na história brasileira pela luta por direitos civis, mas não, o programa de Dilma para a área não é progressista - nem arrojado na defesa do pouco que propõe -, o que não impediu que a oposição usasse esse item, por meio de spams, para ataca-la como defensora do aborto e dos homossexuais - o quadro em questão, se você duvida, foi trazido à baila com conotação negativa.
Isso é uma situação complexa porque põe não só o PT como toda a esquerda em xeque. Como explicar que Dilma não é culpada pelo que não propôs, mas que deveria ter proposto? É uma armadilha que não tem resolução simples no aqui e agora porque nasce historicamente da leniência eleitoral e eleitoreira dos grandes partidos brasileiros com os setores religiosos, o que da falta de coragem - e do oportunismo - em delimitar o que é o Estado Laico, gerou um vício de comportamento numa sociedade que passa longe de ser (ainda) a mais turbulenta nesse sentido. O ponto é que grande parte do que acontece é fruto de uma construção histórica, de todo um acúmulo não resolvido de questões centrais. Tudo isso, graças ao papel da mídia, foi o suficiente para suplantar todo o debate pesado em torno da política econômica e da política de relações exteriores.
Outro ponto, é a posição de Marina Silva na campanha. Seu eleitorado, subitamente anabolizado pela posição simpática da mídia, mostrou-se de uma heterogeneidade que nunca se viu na história eleitoral brasileiro: Conheço liberais convictos que votaram em Marina porque sabiam que sua equipe econômica era mais liberal que a de Serra, alguns ambientalistas e cientistas insatisfeitos com os rumos do Governo Lula, religiosos e muito religiosos que viam nela uma opção de acordo com os preceitos que entendem que devem - seja lá como - concretizados legalmente, socialistas e ex-socialistas, jovens que viam nela uma posição cômoda e insatisfeitos em geral com a polarização Dilma-Serra. A concretização deste complexo arranjo, que surpreendeu institutos de pesquisa, cientistas políticos e até este humilde blogueiro que vos fala, novamente, só foi possível pelo direcionamento que foi dado a maneira como as coisas foram narradas.
O confronto entre a política de esquerda e a mídia militante é o confronto da nossa época e que é uma das causas de existência deste próprio blog. Embora não tenha sido realizada a tão esperada regulamentação da mídia, é fato que o atual Governo produziu situações não-alinhamento com a mídia corporativa tradicional como nunca antes visto, o que se materializou na abertura de novos canais de TV, pulverização de verbas publicitárias estatais e, claro, a criação de condições econômicas para a expansão da Internet nos lares brasileiros - o próprio tempo que muitos de nós tem para blogar é fruto dessas condições gerais decorrentes dos êxitos da política econômica atual. No momento em que a mídia militante - e advogada de causa própria - resolver ir para luta e viu o Presidente dizer que "agora a opinião pública são todos os cidadãos", ela resolveu jogar sujo até quando e onde pode. O negócio virou estritamente pessoal.
E não me falem em despolitização do eleitorado. Fosse isso há dez ou quinze anos atrás e Serra teria sido eleito em Primeiro Turno, meus caros. O eleitorado continua bastante despolitizado, mas perto do que foi um dia, está ótimo. Dilma, de todo modo ficou com 47% dos votos válidos - mais do que Lula em 2002, por exemplo - contra 32% de Serra e 19% de Marina. A candidata petista precisará de algo mais do que 15% dos votos em Marina e nos minoritários para vencer o Segundo Turno o que é perfeitamente possível. O panorama que toma as eleições presidenciais é de mais desgaste contra a figura pessoal de Dilma, só que desta vez resta a figura não muito carismática de Serra no lugar de Marina, dado que não é possível comparar números dos dois governos sem que isso penda favoravelmente para o PT - o que alija o PSDB de sua principalmente arma, o monopólio de uma transcendental razão técnico-administrativa, instrumento de abertura do caminho único, objetivo e neutro que traria os únicos resultados econômicos e sociais racionalmente possíveis; justamente aquilo que lhe permitiu discursivamente imprimir sua marca histórica, a constante naturalização das contradições sociais e normalização das práticas de dominação, especialmente, pela negação da luta de classes ou da sua inserção neutra nela; para isso, o PSDB demanda não ter com quem comparar seus resultados, se forem melhores, ocorre uma implosão do seu discurso como visto agora, o que lhe obriga a ir à reboque do que diz a mídia corporativa de massa.
Do outro lado, a tática lulista de ocupar o Senado deu certo. A noite de ontem nos brindou com as boas notícia de que Heráclito Fortes, Arthur Virgílio e Marco Maciel estão fora do Senado assim como César Maia, Raul Jungmann e Germano Rigotto estão fora dele. Sim, o Senado é uma instituição falida, mas nunca na história deste país nos vimos diante de um Senado tão razoável. Por outro lado, o PT fez a maior bancada na Câmara (88 cadeiras), seguido de PMDB (79 cadeiras) e com diminuição considerável dos deputados tucanos (de 65 para 53) e de demistas (de 65 para 43). Nos Governos estaduais, o desempenho do governo foi melhor do que se supunha, fica o destaque para a belíssima vitória de Tarso Genro no Rio Grande do Sul. O Segundo Turno, enfim, será duro, mas não pouco interessante.
P.S.: Você encontra um bom link par avaliar com ficou a distribuição de forças no Politicando
É meu caro Hugo,
ResponderExcluirA apuração de ontem foi tensa. Como eu já havia comentado anteriormente aqui já não acreditava muito numa vitória da Dilma no primeiro turno depois de ouvir a onda de boataria que tomou conta das sessões eleitorais aqui da minha região. Moro em São Paulo, mas num bairro repleto de migrantes de todas as partes do Brasil, de gaúchos a paraenses, passando por dezenas centenas de milhares de nordestinos. Pode não ser tão representativo, mas ajuda a tomar uma imagem do geral.
E é bom se preparar, pois estou prevendo um crescimento perigoso da rejeição à Dilma e ao PT. os adversários já descobriram quais armas funcionam, vão procurar reforcar o calibre.
Agora, frustrante mesmo, foi a vitória do Alckmin no primeiro turno, e por tão pouco...
Um forte abraço!
Edu,
ResponderExcluirPois é, meu caro. Agora é plebiscito mesmo. As conquistas do Governo Lula de um lado e o que foi o Governo FHC do outro. Como fica Serra frente a frente de Dilma, quem bate fica claro. Fácil nada é, mas esperemos, a última semana foi de uma grande falta de racionalidade - ou sobra dela, para rebater ataques que não eram racionais.Continuo confiante.
abraços
E, claro, você percebeu essa tendência muito melhor do que eu. Aqui onde eu moro, o voto foi massivo em Dilma e no PT, junto com as análises de opinião. Abraços
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